Por Seth Kugel, The New York Times News Service/Syndicate
Ah, é mesmo. Olhei para fora e vi o imenso Lago Taupo, que fica na Ilha Norte
da Nova Zelândia. A visão de patos deslizando bem perto da margem foi
revigorante. Assim como as montanhas que se erguiam por trás deles, além do
azul-lavanda e do laranja que cobriam o céu antes do amanhecer.
Era a minha terceira noite em um motorhome, um veículo recreativo em
miniatura _ o meu era do tamanho de uma van de encanador _ que é o alojamento
móvel favorito dos neozelandeses. Tirei os lençóis, reorganizei as almofadas,
abri alguns compartimentos e pronto: tinha dois bancos confortáveis e uma mesa
para tomar café. Do armário da cozinha, veio um cereal Weet-Bix. Coloquei
algumas salsichas boerewors e ovos mexidos no fogão. Depois de lavar os pratos
na pia, estava pronto para o meu próximo destino.
Os motorhomes representam um modo de vida _ ou pelo menos uma forma de lazer
_ na Nova Zelândia, um belo país que suplica para que façamos trilhas, escalemos
e acampemos nele. Desse modo, ele casa perfeitamente com o motorhome, que faz
com que você se sinta o mais próximo do ar livre o possível _ isso se você não
tiver uma barraca. E ao contrário dos veículos recreativos que os americanos
tendem a considerar como a marca registrada sedenta de combustível de
aposentados itinerantes, os motorhomes estão por toda parte, sendo usados por
neozelandeses de todos os matizes. Uma pessoa com quem conversei a respeito
disse até mesmo que eles são uma "moda".
O meu não estava na moda. Eu tinha alugado o mais barato que consegui
encontrar: um Volkswagen quadradão de 2006 alugado no Backpacker
(backpackercampervans.org) por 64 dólares neozelandeses por dia, com impostos,
taxas e seguro básico incluídos. Embora eu tenha ficado ressentido por não
alugar um dos veículos mais caros e descolados, de aparência mais brilhante e
cores vivas, o Backpacker era perfeito para os meus propósitos.
Seth Kugel/The New York Times
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Ele também me ajudou a economizar uma boa grana. O único senão é a economia
de combustível _ a gasolina custa cerca de 8,50 dólares por galão (cerca de 3,8
litros) na Nova Zelândia, e meu Backpacker fazia 27 quilômetros por galão. Mas é
possível economizar em praticamente todo o resto. O mais óbvio: não é necessário
pagar por quartos de hotel. Quem dirige motorhomes tem a opção de se hospedar em
um "estacionamento de férias", que fica em média em torno de 20 dólares por
pessoa por noite, disponibilizando chuveiros, banheiros, cozinhas (algo
desnecessário) e uma fonte de energia, ou enfrentar por conta própria um
"acampamento livre", permanecendo em terras públicas, o que é punível pela
lei.
Com o motorhome, dá também para economizar em comida. Eu me virei muito bem
ao longo de quatro dias com 60 dólares em mantimentos, e fiz apenas uma refeição
fora do veículo: um prato de mexilhões de lábios verdes que me custou 17 dólares
no irresistível restaurante Coromandel Mussel Kitchen, localizando na cidade de
mesmo nome. Somem-se também paradas para tomar o café com leite "flat white" (a
resposta neozelandesa ao latte), um lanche ocasional e uma garrafa barata de
shiraz da região, e meus gastos com alimentos e bebidas ao longo de quatro dias
e noites ficaram em menos de 100 dólares neozelandeses.
Na verdade, isso incluiu alimentar alguns convidados. Cruzando a Península
Coromandel, no lado leste da Ilha do Norte, ao longo da estrada 309, eu fiz uma
parada no que se tornou uma espécie de atração turística _ o trailer decrépito
de Stuart, um fazendeiro que, curiosamente, possui 48 porcos semisselvagens.
Assim que desci do motorhome, dezenas deles apareceram e praticamente correram
em direção ao meu veículo. Eles foram simpáticos e curtiram muito um cafuné na
barriga, mas suspeitei de que tinham descoberto que os motorhomes têm cozinhas.
Servi a eles o excesso do meu estoque de Weet-Bix.
O lado oeste da península apresenta um litoral sinuoso e praias pedregosas,
além de antigas cidades mineradoras, como Thames e Coromandel; o lado leste é
mais conhecido por seus belos trechos de areia, incluindo a Hot Water Beach
(praia de água quente), onde a altura da água geotérmica aquecida fica pouco
abaixo da superfície da areia. Isso cria um estranho fenômeno durante a maré
baixa: dezenas de adultos revivem a infância em que construíam castelos de
areia, cavando buracos com pás para criar banheiras de hidromassagem
temporárias.
Minha última parada na Península Coromandel foi a Reserva Marinha Te
Whanganui-A-Hei (Cathedral Cove), onde trilhas bem marcadas entre as árvores
levam a uma série de praias e enseadas. Nenhuma delas é tão bonita quanto a
própria Cathedral Cove, um grande meia-lua com colinas que se erguem por trás da
areia, e uma rocha em forma de esfinge na beira da água. Eu a tinha toda para
mim, embora houvesse muitas evidências de que muita gente tinha passado por lá
no início do dia, incluindo uma mensagem escrita na areia em coreano. Curioso,
tirei uma foto e a enviei para um amigo, que a traduziu: "Charlie, eu te amo.
Jae Sok".
Seth Kugel/The New York Times
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Mas o motorhome brilhou de verdade ao passar pela Rodovia Forgotten World
("Mundo esquecido"), onde fui depois do Lago Taupo. Peguei um mapa da estrada em
um i-SITE, centro eficiente e conveniente de informações turísticas da Nova
Zelândia, onde é possível também fazer reservas de hospedagens que vão desde
pequenas cabanas até grandes complexos (tomei um banho extremamente necessário
por 5 dólares em Rotorua). Não consegui deixar de parar em quase todas as
sugestões que me fizeram, incluindo a peculiar cidade de Whangamomona, que
declarou sua independência da Nova Zelândia como república em 1989, e comemora
um janeiro sim, o outro não, a eleição de um presidente (é tudo muito jocoso:
uma cabra e um poodle já foram eleitos).
O melhor lugar de todos, porém, ficava a 10 quilômetros dali: era Ohura, uma
pequenina e quase fantasmagórica cidade _ nenhuma das vitrines do centro
comercial de três quarteirões que visitei na sexta de manhã mostrava negócios em
funcionamento. O museu da cidade, no que costumava ser uma loja de ferragens,
está na ativa _ contanto que você consiga alguém para abri-lo para você. Um
morador me indicou Charley Hedges, cuja casa ficava em um longo caminho à
direita da rua principal. O que ele não me contou foi que Charley e sua esposa
maori, Janet, iriam primeiro me convidar para ir a sua casa e dividir comigo
café, biscoitos e comentários espirituosos quanto à vida que levavam no interior
desde que se mudaram da cidade de Hamilton, a terceira maior da Ilha do Norte,
para Ohura.
O museu está cheio de coisas misteriosas, intrigantes e maravilhosas, doadas,
segundo Janet, por famílias e empresas locais, muitas vezes quando elas foram
embora da cidade ou fecharam suas empresas. Havia uma lista telefônica local de
1954 pendurada em um telefone a manivela, obviamente várias décadas mais velho,
além de uma coleção de antigas máquinas agrícolas, entrei as quais uma
geringonça enorme que Charley me contou ser um dispositivo para cortar palha.
"Uma máquina grande para executar um trabalho pequeno", disse ele.
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Quando parti, já era o meio da tarde. Acelerei, então, pelo resto da estrada.
Mas não pude deixar de parar para desfrutar de uma vista deslumbrante, em meio
às colinas verdes, em um lugar chamado Tahora Saddle. Parei o motorhome na
pequena área de observação _ perfeita para um piquenique. Corri até a traseira
do veículo e preparei uma salada com ingredientes que tinham sobrado _ folhas de
espinafre, abacate, fatias de pera asiática e brócolis. Cortei o último pedaço
de queijo Cheddar em fatias, quebrei bolachas cracker, trouxe tudo para fora e
caí nas boas graças do sol _ e sobre a glória do meu motorhome _ enquanto
comia.
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Osvaldo Aires Bade Comentários Bem Roubados na "Socialização"
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