Seqüência começou com 'O Declínio do Império Americano', em 1986, e continuou com 'As Invasões Bárbaras'
31 de dezembro de 1989 | 21h 00 Neusa Barbosa, da Reuters
Observador atento e irônico das contradições da civilização moderna, o cineasta canadense Denys Arcand completa uma trilogia informal sobre esse tema no filme A Era da Inocência, que entra em circuito em São Paulo e Rio de Janeiro nesta sexta-feira, 29.
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Trailer de 'A Era da Inocência'
A trilogia foi iniciada em 1986, com O Declínio do Império Americano, e continuou em 2003, com As Invasões Bárbaras, que venceu naquele ano o Oscar de filme estrangeiro.
O intérprete ideal deste ceticismo com a modernidade é o protagonista Jean-Marc Leblanc (o ator de TV e teatro canadense Marc Labrèche, que atua pela primeira vez sob a direção de Arcand). Ele é um apagado funcionário público do Departamento de Direitos Civis onde enfrenta, diariamente, uma rotina que está esgotando toda a sua energia.
Em casa, sua vida familiar é nula. Ele quase não fala com a mulher Sylvie (Sylvie Léonard), uma agressiva e bem-sucedida corretora de imóveis. Suas duas filhas adolescentes preferem o som de seus Ipods a qualquer conversa com o pai.
No trabalho, Jean-Marc frustra-se por sua impossibilidade de solucionar os inúmeros problemas de uma verdadeira multidão, que procura a repartição todos os dias.
Mais uma vez ironizando as instituições públicas canadenses, Arcand retrata-as como imensas estruturas inoperantes. Como fizera em As Invasões Bárbaras, ele novamente faz um retrato negativo dos hospitais, desta vez usando como pretexto a doença da mãe de seu protagonista.
No auge da insatisfação existencial, Jean-Marc escapa mentalmente para fantasias mirabolantes com uma top model (Diane Kruger, de Tróia). Ele se imagina transformado num homem másculo, poderoso, que protagoniza as mais incríveis aventuras.
Num dia em que arrisca uma aventura na vida real, Jean-Marc envolve-se com uma bela mulher, Béatrice (Macha Grenon). Logo descobre que ela faz parte de um grupo de pessoas que se fantasiam de personagens históricos (no caso dela, da rainha Beatriz de Savóia) e encenam torneios idênticos aos medievais, com cavalos e tudo.
A ironia contra os ardorosos fãs de O Senhor dos Anéis é evidente, com direito a uma citação direta à trilogia de Peter Jackson.
Além das instituições governamentais, Arcand volta sua crítica igualmente contra a mídia. Impossível pensar que foi por acaso que criou a personagem de Karine, jornalista ninfomaníaca e corrupta interpretada com malícia por Emma de Caunes - filha do ator e diretor Antoine de Caunes, que foi apresentador do programa Eurotrash com o estilista Jean-Paul Gaultier.
Uma curiosidade para os espectadores de língua portuguesa será ver, numa brevíssima cena, um exemplar do Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa, nas mãos do protagonista.
Na coletiva deste filme, que encerrou o Festival de Cannes 2007, Arcand afirmou que admira muito o escritor português e que escolheu este livro por se adequar ao clima de sonho que caracteriza o personagem Jean-Marc Leblanc.
Osvaldo Aires Bade Comentários
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