sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

CINEMA - "Festim Diabólico" mostra crime que chocou o mundo; leia entrevista

Fonte: Jornal "Folha de São Paulo" on line, 10/02/2012 - 14h16

Direção: Carlos Porto. Duração: 80 minutos. Não recomendado para menores de 16 anos.
FABIANA SERAGUSA
DE SÃO PAULO
Atualizado às 16h18.
Rinaldo Martinucci/Divulgação
Alexandre Barros (esq.) e André Fusko (dir.) em cena de "Festim Diabólico", que se baseia no texto que inspirou o filme de Hitchcock
Alexandre Barros (esq.) e André Fusko (dir.) em cena de "Festim Diabólico", que se baseia no texto que inspirou o filme de Hitchcock

A história é tão mórbida e perversa que parece ficção, mas a peça "Festim Diabólico", em cartaz no shopping Frei Caneca (centro de São Paulo), tem como base um crime que chocou o mundo em 1924.
Na época, os colegas Leopold e Loeb mataram um garoto de 14 anos, em Chicago (Estados Unidos), apenas pela "vontade de cometer um crime perfeito". E foram condenados à prisão perpétua.

"Tem gente que descobre, depois do espetáculo, que é tudo inspirado em fatos e fica chocada!", conta o ator André Fusko, que faz um dos assassinos. Já Alexandre Barros, que interpreta o outro matador, ressalta a atualidade da peça: "É surpreendente observarmos como a sociedade não evoluiu moralmente em nada".
O texto do dramaturgo inglês Patrick Hamilton (1904-1962) também serviu de base para o longa homônimo de Alfred Hitchcock, indicado ao Oscar de melhor filme de 1948.
Barros diz que, na peça, o escritor não nos diz o que fazer: "Mas acredito que aponta caminhos para um mundo melhor". Fusko acha que o assunto faz o público refletir com mais cuidado: "O que eu gostaria é que as pessoas parassem para pensar quando, elas mesmas, têm esta sensação de superioridade."
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CENÁRIO E IRONIAS
Quando as luzes se acendem, já vem o primeiro choque: um corpo pendurado de ponta-cabeça, todo remendado. É ele fica lá até o final, enquanto os dois jovens --cheios de suspense e sarcasmo-- recebem uma série de convidados para um jantar em homenagem a um amigo deles. Amigo que não aparece.
Além de Alexandre Barros e André Fusko, a peça também conta com André Hendges, Carlos Capeletti, Brigida Menegatti, Patrícia Vilela e Ricardo Homuth no elenco. A direção é de Carlos Porto.
Os ingressos custam R$ 10 (às sextas) e R$ 40 (sábados e domingos).

Eduardo de Santhiago/Divulgação
Ricardo Homuth, André Fusko e Alexandre Barros (esq. p/ dir.) em cena do suspense "Festim Diabólico"
Ricardo Homuth, André Fusko e Alexandre Barros (esq. p/ dir.) em cena do suspense "Festim Diabólico"
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LEIA ENTREVISTA COM ATORES:
Guia Folha - O que você acha que a peça tem de mais marcante?
André Fusko - O que mais gosto é da ideia, o tema, o assunto que o texto traz à tona. A sensação de superioridade que pode levar a um assassinato. Como quando assistimos aum filme de "bang bang" e achamos correto ver cowboys matando índios, pois cowboys são superiores. Assim como os soldados americanos são superiores aos "vietcongs feiosos" e achamos as cenas de explosão de aldeias e rajadas de metralhadoras --que mata dez vietnamitas por segundo-- algo catártico e positivo. Quando garotos queimam mendigos porque são superiores. Quando rapazes atacam homossexuais na avenida Paulista. Quando a sensação de superioridade nos leva a pensar que temos mais direitos sobre a vida do que os outros. É isso que, no espetáculo, leva o Guga e o Otávio a cometerem o assassinato do playboyzinho Rick.
Alexandre Barros - A reflexão sobre a essência da maldade. Existe um fascínio no texto de Patrick Hamilton que nos conduz pela mão pelos caminhos que normalmente evitamos no cotidiano. Isto é feito através de uma narrativa provocante onde cabe o suspense, o humor e a compaixão.
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Guia Folha - Você acha que o fato de ser baseada em uma história real deixa tudo mais interessante?
André Fusko - Sim, torna o espetáculo mais contundente. Tem gente que descobre, depois do espetáculo, que é tudo inspirado em fatos e fica chocada! Aí para pra pensar com mais cuidado. O que eu gostaria é que as pessoas parassem pra pensar quando, elas mesmas, têm esta sensação de superioridade. Difícil admitir, mas acho que é quase natural do homem. Acho que muitos conflitos nascem do exagero dessa sensação de superioridade. Sentir-se superior porque é mais feliz, porque estudou mais, porque é descendente de europeu e não de africano (agora falando de preconceito racial), porque é mais bonito, mais alto, mais rico, mais...
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Guia Folha - Por que vale a pena ver a peça?
André Fusko - Porque você vai assistir a um suspense incrível. Algo difícil de acontecer. Mas não é porque se trata de um suspense que você vai deixar de rir e, principalmente, de se divertir! Teatro pode não ser caro e ainda fazer sua noite divertida e relevante!
Alexandre Barros - É uma peça que não deixa o espectador sair de mãos vazias: em todas as sessões pessoas nos parabenizam pelo divertimento e pelas perguntas e conclusões que "Festim Diabólico" propiciam ao público há tantos anos.