Muçulmanos se sentem ignorados na corrida presidencial francesa
Por Steven Erlanger, The New York Times News Service/Syndicate
Marselha, França – Nassurdine Haidari sabe que pessoas como ele – negro,
muçulmano e ex-imame – não são o público-alvo dos candidatos à presidência da
França. Apesar disso, ele está indignado com o fato de que eleitores dos
"banlieues" (subúrbios pobres das cidades francesas, onde a maior parte da
população é imigrante), além de não serem levados em conta, também são usados
como símbolos para a promoção de ansiedades raciais e religiosas.
"Os 'banlieues' são a grande ausência na campanha", disse Haidari. "Não
falamos sobre eles. As pessoas não gostam de falar a respeito. Elas não querem
se envolver."
Com 34 anos e nascido na França, de pais vindos de Comores, na costa leste da
África, Haidari é muito bem sucedido – é vice-diretor para a juventude e o
esporte da Primeira e da Sétima Divisões Administrativas de Marselha e membro do
Partido Socialista.
No entanto, segundo Haidari, até o candidato presidencial do seu partido,
François Hollande, cuja campanha se baseia na diversidade, na igualdade e em
novos investimentos em empregos e educação, fala disso apenas em termos gerais.
"A classe política inteira tem um problema com o Islamismo", ele disse. "Ela
está desconectada da realidade."
Haidari afirma que Hollande propõe a criação de um cargo ministerial para as
mulheres, mas não para os árabes. "Precisamos de um ministro da igualdade, que
lide com todas as formas de discriminação", ele disse.
Ele afirma ainda que o presidente Nicolas Sarkozy e os membros da Frente
Nacional, o partido de extrema direita, estão assumindo a estratégia política da
divisão e do uso de bodes expiatórios. "A questão não é a burca", o véu de rosto
inteiro, ele disse. "Eles fazem isso para aumentar a pressão, para mostrar às
pessoas que 'sabem como lidar com os muçulmanos'."
Os discursos estão especialmente agressivos agora, depois dos assassinatos de
sete pessoas em Toulouse – três soldados muçulmanos e quatro judeus, dos quais
três eram crianças – por um muçulmano nascido na França, Mohammed Merah, de 23
anos, que afirmou ter se inspirado na Al-Qaeda. Depois dos assassinatos, houve
uma série de prisões de radicais islâmicos suspeitos, o que Sarkozy afirma não
ter nenhuma conexão com o caso de Toulouse ou a política presidencial.
Até mesmo em Marselha, cidade famosa pela sua tolerância, há uma debate
acalorado ligado ao projeto de construção de uma grande mesquita, que vem
sofrendo problemas políticos e financeiros e causando acirrados conflitos
internos entre muçulmanos. Ao todo, os muçulmanos representam cerca de 30 por
cento dos 850.000 habitantes de Marselha, mas estão tendo mais filhos do que a
população não muçulmana. Em toda a França, eles representam entre 8 e 9 por
cento da população de 63 milhões de pessoas.
"A prefeitura nunca quis uma grande mesquita", disse Haidari. "Esta é uma
cidade profundamente cristã, onde a Frente Nacional tem muito poder, e decidir
construir a maior mesquita da França na segunda maior cidade do país significa
perder muitos votos. As pessoas daqui querem um islamismo invisível; elas
preferem pequenas salas de culto a uma grande mesquita do tamanho de uma
catedral."
Sarkozy, da conservadora União por um Movimento Popular, e a Frente Nacional
– que foca no islamismo imigrante e radical e nos costumes muçulmanos –
empurraram a política francesa para a direita.
"Existe uma 'direitização' da política na França, mesmo na esquerda", disse
Haidari, afirmando que um dos assuntos predominantes desse processo é o
islamismo. "É mais fácil ter um templo budista do que uma mesquita. Por quê?
Porque uma mesquita levanta a questão do islamismo na França."
Quanto aos próprios muçulmanos, "eles não ligam para a mesquita – querem
empregos, comida e uma boa educação", disse Haidari. Segundo ele, as questões
principais são os empregos, a discriminação e a má qualidade do ensino. Ele
afirma que as crianças muçulmanas saem da escola sem qualificação para
trabalhar.
"Uma criança que nasce já está condenada a ser excluída da sociedade, porque
vive em uma favela e não recebeu a educação adequada", ele disse. "Há uma
organização em guetos, que cria injustiça."
No entanto, a discussão constante sobre o islamismo faz com que os muçulmanos
tenham uma sensação maior de identidade e distanciamento. Em um relatório
recente, "Banlieue de la Republique", escrito por Gilles Kepel, especialista em
islamismo do Instituto de Ciência Política, descobriu uma "intensificação da
identidade muçulmana" e um crescente distanciamento em relação à sociedade
francesa em geral.
Depois das revoltas de 2005, os problemas dos "banlieues" foram abordados na
campanha presidencial de 2007, e o vencedor, Sarkozy, prometeu um "Plano
Marshall" para os subúrbios e nomeou uma feminista, Fadela Amara, para o cargo
de ministra-adjunta. A maioria desses grandes planos foi por água abaixo por
motivos políticos e por causa da crise econômica, assim como os ministros das
minorias e muçulmanos, que Sarkozy havia nomeado como parte do seu plano, há
muito abandonado, de "abertura" para a esquerda.
Mesmo assim, Sarkozy conseguiu investir mais de US$ 30 bilhões no que os
franceses chamam de "zonas urbanas sensíveis", e pode se vangloriar por não ter
havido mais nenhuma revolta desde 2005, mesmo que o nível de desemprego entre os
jovens nessas áreas esteja em 45 por cento.
Na região pobre do norte de Marselha, onde a nova mesquita seria construída
no local onde ficava um antigo matadouro, ao lado de uma escola paroquial
chamada Saint-Louis, habitantes brancos e pobres, na maioria marinheiros
aposentados, estão felizes que o projeto pareça ter sido abandonado. "Precisamos
construir algo que gere dinheiro e empregos, e não uma mesquita", disse um
freguês do Gran Bar Bernabo. "A cinco minutos daqui, crianças estão usando
drogas."
Na mesma rua, Muhammad Jamat trabalha na mercearia do seu tio, Les Epiceries
de Provence. Jamat, de 34 anos, que nasceu na Tunísia e tem uma licença para
dirigir caminhões pesados e transportar cargas perigosas, disse ter vindo para
cá da Itália porque Marselha é um porto, e ele tinha certeza que encontraria
muitos trabalhos para caminhoneiro.
Mas ele afirma que, em diversas ocasiões, amigos brancos com menos
qualificações conseguiram serviços para os quais ele não foi aceito, por causa,
segundo ele, do seu nome muçulmano, sua pele mais escura e seu endereço na
Décima Quinta Divisão Administrativa, conhecida pelos imigrantes e pela
criminalidade.
"As pessoas olham para o endereço e dizem: 'Não contratamos pessoas de lá'",
ele disse. "Ou então, dizem que vão ligar, mas não ligam." Ele afirma estar
nervoso, desmotivado e infeliz por depender do seu tio, mas precisa alimentar
seus dois filhos pequenos. "Hollande não mudará a situação", ele disse, sobre o
candidato à presidência.
Hollande apresentou algumas propostas, especialmente em um discurso que fez
aqui, prometendo criar empregos em áreas onde o índice de desemprego é alto e
isenções fiscais para empresas que contratarem moradores dos "banlieues";
educação melhor, incluindo aulas de francês; mais policiais; mais médicos
jovens; e moradias melhores. Como socialista, Haidari disse preferir Hollande.
"Mas ele precisa botar a mão na massa, e não ficar apenas falando de símbolos",
ele disse.
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