Às vezes ficamos sem inspiração e apenas rodamos o algoritmo conforme a classificação do que está sendo comentado na internet. É fácil encontrar a meia dúzia de palavras que está no texto de todos os “progressistas”, o novo nome da esquerda anti-capitalista de sempre.
Mas tem vezes em que a coisa enguiça. Parece estar todo mundo na mesma pontuação. Todos os sites progressistas falando da mesma coisa, na mesma hora, com as mesmas palavras (nisso atingiram perfeitamente a igualdade).
Aí não tem jeito: para saber quem tem prioridade e deve ser mais comentado, precisamos correr logo para Leonardo Sakamoto.
Em seu blog no UOL, o jornalista reclamou dos “preconceitos” de quem zoou Romário por este sair com uma “mulher trans”.
“Mulher trans”, “liberal-fascista”, “homem urso”, “meio grávida”, “católico ateu”. É com esse tipo de conceito que funciona a mente progressista. Não se trata de falácias, ou seja, falhas na construção de um silogismo: trata-se de erros até nos conceitos que buscam refletir a realidade. Assim, mesmo um esquerdista mestre da lógica, com pós-doc em Filosofia, notável analista de narrativas (a Escola de Frankfurt foi feita assim), não deixa de ser um completo divorciado da realidade mais factual.
A crítica de Sakamoto é que “O que define uma mulher não é o que ela tem ou teve entre as pernas”. Ou seja, uma mulher pode ser… um homem. Talvez um alemão possa ser um tailandês. Ou uma foca talvez possa ser um ornitorrinco. Como já diz a sabedoria popular, na falta de um original, qualquer objeto em sua mão pode se transformar em um martelo. E se tudo o que você tem à mão é um martelo, trate o mundo como um grande prego.
Diz o nosso japa preferido que “Você se sentiu sexualmente atraído por uma mulher. Dai descobre que ela tem ou teve o mesmo órgão sexual que você”. Para Sakamoto, tudo o que define uma mulher é o quanto alguém “se sente e se expressa” mulher. Se eu, homem, “me sentir” mulher e dar uns malho no Sakamoto, ele continuará sendo hétero (?!), porque teve uma relação homem-mulher. No entanto, para tal, preciso “me expressar” como mulher. Todavia, as formas de como uma mulher “se expressa como mulher” (batom, saia, salto alto, bolsa, dirigir mal, acreditar em horóscopo, ter a “capacidade” de ser estuprada vaginalmente, pintar as unhas) são apenas performances socialmente construídas (?!?!), e não algo intrínseco ao sexo, que é diferente do gênero, porque os transexuais redefiniram essa distinção básica (?!?!?!?!). Entendeu? Nem eu. Mas tá lá no Sakamoto e nas baboseiras que a Judith Butler escreve. Ops, desculpe. @ Judith Butler. Não podemos fazer distinção de gênero na gramática.
A esquerda tem duas preocupações com esse tipo de “analítica”. Tudo surgiu com Michel Foucault e sua crítica à “sociedade disciplinar” (antes dele, o feminismo estava mais preocupado com salários iguais para mulheres em fábricas nos tempos de guerra, depois estas causas urgentes de agora se tornaram a preocupação principal de seres semoventes).
Trata-se antes de tudo de subverter não valores e tradições, como costumam reafirmar certos conservadores, mas sobretudo de estraçalhar padrões de medida. Ou seja, medidas fixas, pelas quais possamos medir outras coisas. Por exemplo, alguém no Brasil é a favor de corrupção e de ditadura? Creio que ninguém diga isso tão claramente. Mas chamando a primeira de “caixa 2″ e a segunda só de “regime comunista”, quantos não passam a imediatamente, nunca antes na história desse país, a dizer que corrupto que compra voto para instaurar uma ditadura é herói nacional?
Sakamoto, nessa atividade, comete uma análise brilhante, mas com conceitos, como visto, divorciados da realidade:
Se aceitar bovinamente viver com medo de seus desejos conseguirá, aí sim, ser um belo de um frouxo. Um covarde que não tem vontade ou opinião própria, mas depende da manada para lhe dizer o que pensar, como se vestir, o que comer e com quem se deitar.Cara, tenho dó de você. Porque, ao temer ser rotulado, compartimenta a vida em caixinhas que, simplesmente, não existem. E interdita a si mesmo em uma sabotagem maluca.“Ah, mas isso é pecado!” Olha, se existir uma entidade suprema, acredite, ela não vai se importar com quem você transa ou quem você beija. Caso contrário, não seria uma entidade suprema, mas algum religioso-fundamentalista-inspirador-de-ódio.
É despiciendo ver como tais ataques à religião são manobra totalitária. Mas não deixa de ser engraçado ver Sakamoto criticando quem “não tem opinião própria”, quem “depende da manada para pensar”, quem “teme ser rotulado”, quem “compartimenta a vida em caixinhas”, compartimentando todas essas pessoas na caixinha com rótulo “religioso-fundamentalista-inspirador-de-ódio” (é com você que ele tá falando, cara).
Diagnóstico perfeito, justamente para explicar quem depende da opinião da manada com sua modinha progressista politicamente correta para pensar, quem teme ser rotulado de coxinha, conservador, reaça e direitista e quem divide a vida entre as caixinhas dos “bacanas” e dos “religiosos-fundamentalistas-inspiradores-de-ódio”.
A segunda preocupação é justamente essa animalização da linguagem. Ao invés do contato direto com a realidade (menino tem pênis, menina tem vagina), temos apenas o contato intermediado pela ideologia propagada por eles, em que eles são nossos únicos defensores – e para nos proteger, precisam de poder. Poder para impedir que outros tenham preconceitos e acreditem em coisas ultrapassadas, como homem e mulher. Como cromossomo X e Y. Como família, papai e mamãe. O totalitarismo de 1984, Admirável Mundo Novo, Revolução dos Bichos, A Revolta de Atlas e derivados começa exatamente assim: tudo, no fim, se torna apenas a máquina estatal e seu mundo perfeito e aplainado.
Com essa animalização, todo discurso apenas age como cachorros, cheirando as partes íntimas de seu interlocutor para saber se fazem parte da matilha amiga ou rival. Caso recaia no segundo caso, basta chamar de conservador, reaça, coxinha etc.
É aí que entra o nosso algoritmo. E é aí que análise de Sakamoto é perfeita em sua lógica, mas inverte completamente a realidade – afinal, ele mesmo pratica o que critica.
Osvaldo Aires Bade
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