O Jornal Diário do Pará deste domingo (02) trouxe ao conhecimento público, uma importante informação aos contribuintes paraenses.
A juíza que trocava favores com os governos do PSDB (Almir Gabriel-Simão Jatene), a mesma que liberou da cadeia, o então presidente da FUNTELPA, o jornalista Ney Messias, hoje, secretário de comunicação do governo do PSDB no Pará – vai continuar afastada da magistratura e se condenada, ainda periga perder o cargo.
O motivo é outro, mas pode reacender a questão que retirou milhões de reais dos cofres públicos e os colocou nos bolsos da família Maiorana e do caixa de campanha dos tucanos.
Detentora de concessões de rádio e TV, sendo repetidora da CBN e da Rede Globo, respectivamente, além de proprietária do segundo maior jornal em termos de vendagem no Estado, as Organizações Rômulo Maiorana e empresas da família, acumulam diversos processos e investigações junto ao Ministério Público do Estado, na polícia Federal e na Receita Federal, em sua maioria, ligados a contratos e convênios com as sucessivas gestões do PSDB no Estado do Pará.
Sabendo da decisão do CNJ, o autor da ação Popular contra o esquema entre a FUNTELPA e a repetidora da Globo no Pará, já pensa em acionar novamente o caso na justiça, agora sem o entrave antes existente, e agora, quase eliminado pelo Conselho Nacional de Justiça.
O povo aguarda que o ditado popular se cumpra: A justiça tarda, mais não falha.
Para compreender melhor o caso, que pode ter enviado recursos financeiros até pra campanha eleitoral de José Serra, ninguém melhor do que o jornalista Lúcio Flávio Pinto, em artigo publicado no site do Observatório da Imprensa e praticamente sem repercussão nos grandes meios de comunicação do Estado do Pará.
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Entendimento por baixo dos panos
Por Lúcio Flávio Pinto, Observatório da Imprensa, na edição 423
06/03/2007
Fez-se incômodo silêncio depois que a juíza Rosileide Filomeno rejeitou a ação popular contra o “convênio” entre a Funtelpa e a TV Liberal [ver remissões abaixo]. A decisão não era para ter qualquer efeito legal, mas parece que teve conseqüências práticas: criou um ambiente favorável a um novo entendimento. Agora, à distância da opinião pública?
A sentença assinada no dia 31 de janeiro pela juíza da 21ª vara cível de Belém, Rosileide Filomeno, julgando “totalmente improcedente” a ação popular proposta contra o “convênio” entre a Funtelpa e a TV Liberal, não devia ter efeito algum, do ponto de vista legal, mas parece ter provocado quase todos os efeitos práticos: esfriou o assunto, tirando-o do âmbito do interesse público, no qual se mantinha até a divulgação da decisão da juíza.
A Fundação de Telecomunicações do Pará ainda não pagou nenhuma das 12 prestações que lhe foram impostas pelo 14º termo aditivo ao “convênio”, assinado no dia 31 de dezembro do ano passado, no último dia do mandato do então governador Simão Jatene, do PSDB, que prorrogou essa relação incestuosa até 31 de dezembro de 2007.
Duas prestações (de janeiro e fevereiro) venceram e deixaram de ser quitadas. E não o serão, segundo a nova presidente da Funtelpa, Regina Lima, até que um inquérito administrativo decida sobre a legalidade do “convênio”, conforme recomendação da assessoria jurídica da fundação, referendada por parecer da Procuradoria Geral do Estado. Caso seja comprovado sua ilegalidade, imoralidade e lesividade ao erário, a fundação determinará a apuração das responsabilidades e a punição dos autores dos fatos. Mas até agora não foi constituída a comissão de três membros que realizará esse inquérito, com prazo máximo de 90 dias para finalizá-lo.
A Funtelpa também não se manifestou sobre a sugestão aqui feita: ao invés de perquirir pela evidente ilegalidade, imoralidade e lesividade do “convênio”, simplesmente revogar o termo aditivo de prorrogação por mais um ano, assinado pelo ex-presidente da fundação, Ney Messias, que também é funcionário da TV Liberal, a empresa beneficiada pelo seu ato derradeiro. Ney, como outros dois presidentes anteriores da fundação, que tomaram decisões amparados por esse instrumento, poderão ter suas responsabilidades cobradas, se uma ação civil pública ou uma ação penal por improbidade, ambas sugeridas pelo promotor público Nelson Medrado, vierem a ser propostas à justiça pelo Ministério Público do Estado. Mas se calado sempre esteve em relação a esse tema, mais calado ainda ficou o MP.
Notícia lacônica
A decisão da juíza Rosileide Filomeno não tem efeito suspensivo. Tanto o promotor Medrado, que atua no caso, como o autor popular substituto, o sociólogo Domingos Conceição, já anunciaram que recorrerão da sentença. No caso do representante do MP, o recurso é obrigatório. E ainda que, por uma hipótese implausível, o MP se omitisse, a própria juíza teria que encaminhar os autos à instância superior, onde a ação terá que prosseguir até a decisão em último grau, em Brasília, conforme manda a regra processual. Só então transitará em julgado, gerando o efeito de considerar legal o “convênio”, como entende a juíza. Ou ilegal, como dizem todas as demais instâncias oficiais.
O reconhecimento da legalidade, por essa circunstância, é pouco provável. Na sua sentença, de 24 laudas (13 delas consumidas com seu relatório), a rigor, a magistrada não enfrentou o mérito da questão. Limitou-se a fazer considerações sobre a operacionalização da relação, sua conveniência (ou não) para a administração pública, em muitos pontos incorporando de tal maneira as razões da parte-ré na ação popular que sua exposição chega a soar como peça de defesa.
A decisão judicial ignora os substanciosos argumentos apresentados por várias instâncias, juntados aos autos, de que a relação entre a Funtelpa e a TV Liberal, mesmo que denominada de convênio, é, para todos os efeitos legais, um contrato. E, sendo um contrato, estabelecido inicialmente para durar cinco anos (mas prevendo desde logo prorrogação), com custo de 12 milhões de reais (valor ampliado já no âmbito do primeiro prazo, qüinqüenal), só podia ser estabelecido através de concorrência pública. Nenhuma palavra da juíza a respeito, o que pode suscitar a alegação de ter ela decidido contra evidentes e robustas provas dos autos.
Embora pareça ter tido efeito anestesiante sobre a opinião pública, a sentença da juíza da 21ª vara cível está muito longe de ser convincente: contrastando e contrariando o entendimento manifestado pela atual direção da Funtelpa, da Procuradoria Geral do Estado e do representante do MP estadual, a magistrada concluiu, surpreendentemente, que o “convênio” é legal e legítimo.
No dia seguinte, O Liberal anunciou a inesperada novidade em primeira página. Tudo que disse a respeito, entretanto, se limitou a umas poucas linhas na chamada de capa. Internamente, nenhuma outra matéria foi inserida. Nem nesse dia, nem nos seguintes. Ao contrário do que se esperava, o jornal da família Maiorana não só não voltou mais ao assunto como jamais reproduziu a íntegra da sentença ou, ao menos, sua parte de mérito.
A lacônica notícia foi o que bastou para que, na primeira página da edição dominical seguinte, o principal executivo da corporação, Romulo Maiorana Júnior, respondendo aos ataques do Diário do Pará, assinasse um artigo utilizando a sentença como prova definitiva de que a razão estivera com ele, não com seus inimigos e contendores. Talvez Maiorana Júnior se sinta moralmente fortalecido para cobrar o que considera seu direito, no momento oportuno.
Serviço remunerado
A suspensão da mensalidade já custou à TV Liberal mais de 950 mil reais, um dinheiro que supera o orçamento da própria Funtelpa (nesse ponto, aliás, devia haver uma necessária investigação sobre a origem dos recursos públicos que têm suportado esse milionário “convênio”: a princípio, essa rubrica era informada nos termos aditivos; depois, só seu código, um conjunto de números, indecifrável ao contribuinte).
Mas como a suspensão unilateral (e formal) do pagamento, estando ainda em plena vigência o “convênio”, equivale a uma denúncia, e unilateral, a empresa dos Maiorana poderá se favorecer da cláusula quinta do documento. O dispositivo estabelece, em sua linguagem tosca: “A parte que der causa rescisão do presente Convênio antes do prazo estipulado, por qualquer motivo, deverá ressarcir à outra parte, dos prejuízos causados, como obrigação líquida e certa, exigível executivamente”.
A vigência do “convênio” foi “legalizada” pelo aditamento de 31 de dezembro do ano passado, conferindo o “direito” de a TV Liberal cobrar indenização pelos danos que sofrer com a denúncia unilateral. Tal possibilidade desapareceria de todo com a simples revogação do 14º termo aditivo, que o tucano Simão Jatene deixou como (mais uma) casca de banana para a petista Ana Júlia Carepa (com os agravantes de criar a despesa nos últimos oito meses do seu mandato, sem previsão dos recursos necessários, contrariando a Lei de Responsabilidade Fiscal). Casca essa que nem os assessores da governadora, nem ela própria, tiram do seu caminho, como se quisessem correr o risco. Ou como se o risco fosse calculado (um cálculo informal e político, certamente).
A revogação não envolve risco legal algum, embora, justamente por sua eficácia cirúrgica, acarrete conseqüências políticas: as Organizações Romulo Maiorana dificilmente reagiriam com a superioridade olímpica que procuraram transparecer ao serem informadas da suspensão do pagamento. Fernando Nascimento, diretor da TV Liberal, garantiu, magnânimo, que nem por isso a emissora lançaria mão de mais uma cláusula leonina (a seu favor, naturalmente) do “convênio”: a interrupção do pagamento da mensalidade autoriza a TV Liberal a, “independentemente de qualquer aviso prévio ou notificação”, “descontinuar” a transmissão de sua programação, que, em essência, é a programação da TV Globo. O sinal da emissora da família Marinho continuaria a subir e a descer do satélite para as 78 torres que o retransmitem para o interior do Pará, até a Funtelpa decidir se continuará ou não a estrambótica relação.
O cancelamento do aditivo significaria, pura e simplesmente, e de imediato, a perda de qualquer validade do “convênio”, sem qualquer direito a reclamação, administrativamente ou judicialmente, por parte da TV Liberal. E sem o menor empecilho para a apuração, cobrança e imposição das responsabilidades devidas pelos servidores que permitiram a transferência ilegal de pelo menos 30 milhões de reais dos cofres públicos para o caixa da emissora, ao longo de nove longos anos.
O cancelamento não impediria a Funtelpa de assinar um contrato precário com a TV Liberal, com duração de 90 dias, até que a fundação decidisse lançar uma concorrência pública, caso quisesse continuar a servir de trampolim para a programação de terceiros, ou se preparar para passar a transmitir apenas a sua programação. Mas, sendo um contrato, a TV Liberal é que precisaria remunerar o serviço de retransmissão. A Funtelpa abriria mão de vez de qualquer “compensação”, mesmo porque nem ela e nem a governadora fizeram qualquer inserção na programação da TV Liberal até agora, passados dois meses da nova gestão estadual.
Embaraços e limitações
A história desse “convênio” é um escândalo, um dos maiores da república no Pará, a merecer a devida apuração – legal, administrativa e política, seja no âmbito do judiciário como do próprio governo, inclusive na Assembléia Legislativa, onde aguarda pouso certo o pedido de uma Comissão Parlamentar de Inquérito.
A Fundação de Telecomunicações do Pará foi criada em 1977, no governo Aloysio Chaves. Nesse mesmo ano a Funtelpa começou a anular uma das suas razões de ser, a de disseminar pelo Estado uma programação não-comercial, de enfoque cultural e educacional, com conteúdo marcadamente regional e estadual, que a TV Cultura iria gerar. Um dos primeiros atos do seu primeiro presidente, Orlando Carneiro, foi assinar um contrato com a TV Liberal, cedendo à emissora de Romulo Maiorana, o pai, sua rede de torres de retransmissão de imagem e de som espalhadas pelo interior paraense.
Mas não integralmente: o primeiro contrato reservava para a Liberal apenas os horários de pique de audiência, deixando que a TV Cultura pudesse usar os intervalos com sua própria programação. Em compensação, a Liberal era que pagava, além de ceder, como bonificação, breves tempos em seu próprio canal para a veiculação de mensagens do governo. O primeiro pagamento acertado foi de 28 mil cruzeiros. Depois passou a ser calculado em valores de referência, como as OTNs
Assim foi mantida a relação Funtelpa-TV Liberal ao longo dos 10 anos seguintes, com algumas variações: os contratos foram renovados e aditados, mas sempre a emissora particular pagando e bonificando o Estado com inserções, que serviam de compensação pelo valor ínfimo recebido pela Funtelpa.
Havia uma nulidade insanável nessa relação: ela não fora estabelecida com base em qualquer forma de licitação pública, nem fora antecedida por um estudo ou levantamento capaz de embasar a decisão da Funtelpa de contratar a TV Liberal. Não houve sequer um ato de dispensa de licitação, que podia ser adotada em função da exclusividade da emissora, como afiliada da TV Globo, de gerar no Pará a programação líder de audiência. Partindo-se, naturalmente, do pressuposto de que seria finalidade de uma TV pública retransmitir som e imagem de uma TV particular, comercial.
Não houve licitação porque não era possível mesmo. Afinal, como justificar que o governo tenha criado uma fundação para administrar seu sistema de comunicação social, com uma emissora de televisão e outra de rádio, se lhe impõe embaraços e limitações? E se é a programação da Globo o que o povo quer, então que a empresa de mercado chegue por seus próprios meios ao cliente potencial. Capitalismo é isso. Ou não?
Prorrogações ilegais
A Funtelpa montou um sistema de retransmissão para a sua emissora de televisão, criada exatamente para difundir uma programação alternativa por todo Estado, e o cedeu para uma empresa particular, que gera programação nitidamente comercial, esmagadoramente concebida fora do Pará, segundo um padrão massificador centralizado (no Rio de Janeiro e, especificamente, na sua cultura litorânea, de Copacabana-Ipanema), e ainda por cima a preço extremamente baixo. Como, então, a TV Cultura podia cumprir sua finalidade? Como justificar sua razão de existir? Como não ficar condenada à estagnação?
Mais do que isso: o “convênio” tornou a TV Cultura ilegal a partir de 28 de maio de 2000. Nessa data, em função da nova legislação sobre telecomunicações do país, as torres de retransmissão da Funtelpa espalhadas pelo interior teriam que passar a transmitir necessariamente apenas a programação gerada pela TV Cultura, sob pena de perder a concessão federal do canal 2 de televisão.
O engenheiro Paulo Roberto dos Santos Sampaio, perito judicial, destacou esse fato no seu parecer, juntado aos autos da ação popular e lembrado por Francisco Cezar Nunes da Silva, o presidente da Funtelpa que assinou o “convênio”. Mas a ilegalidade permaneceu, enquanto a agência reguladora, Anatel, dizia nada ter com o assunto.
A trapalhada, que já era grande, tornou-se irremediável em 1997. Ao invés do tradicional contrato, foi forjado um convênio. A TV Liberal, que antes pagava para usar as torres da Funtelpa, sem contestar essa necessidade elementar, agora passava a receber. A compensação não onerosa, que eram as inserções de mensagens do governo na grade de programação da TV Liberal, passou a ser contabilizada como encontro de contas. Foi deliberadamente omitido o fato de que o alcance do sinal da emissora crescia, de súbito, 150%, passando a atingir cinco milhões de pessoas e não mais apenas 2 milhões, como ocorria até então, com as devidas implicações dessa ampliação de cobertura sobre o faturamento da televisão dos Maiorana.
Só podendo durar um ano, renovável por igual período, a vigência do convênio passou a ser de cinco anos, renovável sempre, com acréscimos de valor que fizeram os R$ 12 milhões chegarem a 29 milhões de reais, sem aplicar a esse valor a correção monetária. Mesmo que, admitindo-se que a forma real fosse o contrato, as prorrogações feitas a partir de 2002 foram completamente ilegais, não só por se exaurir sua validade em cinco anos como porque o valor reajustado ultrapassou – e de muito – o limite legal de 25%.
Ótica exclusivista
Como flagrantes imoralidades e ilegalidades desse tipo puderam receber tintura de coisa sã em uma decisão judicial, como a da titular da 21ª vara cível de Belém? Incorporando as alegações dos responsáveis por esses atos, a juíza Rosileide Filomeno disse em sua sentença que só a TV Liberal tinha capacidade técnica para realizar o serviço acertado no “convênio”; que esse serviço iria contribuir para a integridade do território paraense, ameaçado de redivisão (com os programas da TV Globo!); que cumpriria as finalidades da Funtelpa; e que a fundação estadual sairia ganhando, já que as inserções a ela oferecidas representavam cinco vezes mais do que custariam se não estivessem ao abrigo do guarda-chuva do convênio (a TV Liberal calculara em um milhão de reais a fatura pelo tempo que cedeu para as mensagens do governo).
Evitando a premissa de qualquer dessas conjecturas, que é a realização da concorrência pública, a sentença ignorou completamente todos os questionamentos feitos a esse raciocínio interesseiro. Em primeiro lugar, nenhum cliente da TV Liberal aceitaria a aplicação da tabela de publicidade a um contrato com cinco anos de duração inicial e valor original de R$ 12 milhões. Cobraria um desconto – e substancioso. É a rotina nesse serviço. Mas a juíza considera a cessão do tempo na afiliada da Rede Globo um benefício excepcional.
Em segundo lugar, se tinha interesse em veicular mensagens na TV Liberal, o correto (e eficaz) era o governo fazer um novo contrato de publicidade com a emissora (além dos que já havia em curso) e não usar um convênio para alcançar esse objetivo, por via oblíqua, de forma muito mais onerosa. Ora, se antes o governo já tinha direito a essas inserções e recebendo (ainda que pouco) pela cessão de seus equipamentos, por que agora ia aceitar a monetarização dessa compensação e ainda ter que pagar, um valor suficiente para atender as despesas da TV Cultura?
Em terceiro lugar, qual a vantagem que a Funtelpa teria em fazer propaganda através da TV Liberal, se conta com sua própria emissora? A resposta é simples de dar. Basta fazer outra pergunta: a TV Liberal aceitaria em sua programação mensagens do SBT, da Bandeirantes ou da Record? Ao utilizar uma emissora comercial, como a Liberal, a TV Cultura nega sua razão de ser, de televisão cultural e educativa, sem fins lucrativos. Seria melhor extingui-la. Na pior das hipóteses, sairia mais barato.
A magistrada não percebeu esse aspecto – digamos assim – filosófico: para ela, a Funtelpa aproveitou “a maciça audiência da programação da Rede Globo de Televisão, àquela época quase hegemônica, para disseminar nos quatro cantos do Estado os assuntos de interesse público”.
Deveras? Quem aproveitou foi o governador. Primeiro, Almir Gabriel, exatamente quando sua popularidade estava em queda, ameaçando sua competitividade no projeto de reeleição e de 20 anos de hegemonia do PSDB no poder estadual, que exigia fazer de Simão Jatene seu sucessor (e, na ótica exclusivista de Almir Gabriel, seu retorno logo em seguida). Inegavelmente, para o sucesso dos tucanos contribuiu a decidida parceria do grupo Liberal.
Acidente de percurso
O “convênio”, que na primeira prestação, de outubro de 1997, despejou no caixa da TV Liberal 200 mil reais e, na mais recente, a de janeiro, iria transferir 476 mil reais, foi uma espécie de abre-alas para a maior programação de publicidade em empresa jornalística já feita pela administração pública paraense, em todos os tempos. Por vários caminhos, ela garantia às Organizações Romulo Maiorana, seus satélites e derivados, algo entre 1,5 milhão de reais e 2 milhões de reais por mês. Nada semelhante houve no país na mesma época.
O casamento do projeto de poder dos tucanos com o apetite de faturamento do grupo Liberal rendeu muitos frutos e seria para sempre, com um final feliz para a dupla, se a política não trouxesse surpresas. E se a relação, ao invés de seguir as regras legais, não fosse incestuosa, clandestina, promíscua, abusiva. Com sua inesperada vitória, beneficiada pelo banzo de insatisfação da população, Ana Júlia Carepa interrompeu o idílio.
Pode ter sido, porém, apenas um acidente de percurso, se o seu silêncio ou a falta de conseqüência nas medidas adotadas forem mantidos. Se isso acontecer, o que era promessa de mudança se tornará a frustração da continuidade – agora, talvez, no ambiente que costuma predominar entre os brancos que, ao fim e ao cabo, se entendem, como bem sabe o povo: por debaixo dos panos.
TV pública: para quê?
O “convênio” Funtelpa/TV Liberal, felizmente, já repercute fora dos limites do Pará, que, por esse critério, são estreitos demais. A revista TelaViva News, por exemplo, veiculou, no dia 1º, um artigo de Carlos Eduardo Zanatta, depois reproduzido pelo Observatório da Imprensa, que merece ser lido (“TV Cultura do Pará pagava à TV Liberal pelo conteúdo Globo”). Ele faz uma sumária abordagem técnica da questão, ressaltando omissões e silêncios que, em conjunto, conspiram contra o esclarecimento do assunto e pelo seu muito cômodo – e conveniente – esquecimento.
Ouvida pelo jornalista, a Anatel se exime de entrar na dança. Alega que sua única exigência é de que haja acordo entre a emissora que gera a programação e a que a retransmite. Mas nesse caso, cabe a pergunta que não quer calar: não é melhor extinguir logo a televisão pública. Se ela deixa de ser uma alternativa às emissoras comerciais, orientadas pelo lucro, não é melhor que desapareça? Assim, pelo menos, não pesará no bolso do contribuinte, que assistirá gratuitamente (em tese, ao menos) ao que as tevês comerciais lhe oferecem. Um cardápio indigesto para os paladares um pouquinho mais apurados.
A esculhambação continua aqui:
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