terça-feira, 10 de novembro de 2015

Lavagem de dinheiro e as “pedaladas” de Sergio Moro!



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Por Cezar de Lima
No último mês, o assunto que ficou em evidência no noticiário dizia respeito ao parecer do TCU que reprovou as contas do Executivo Federal devido às denominadas “pedaladas fiscais”.
Entretanto, na última semana, o Juiz Sergio Moro, ao proferir sentença no caso da Operação “Lava Jato”, condenou o ex-assessor parlamentar (Ivan Vernon) do então deputado federal Pedro Correa, pelo crime de lavagem de dinheiro, utilizando como fundamento a contraditória tese da ‘cegueira deliberada’ que se equipara ao dolo eventual.
Apenas para entendermos o contexto, o Ministério Público Federal apontou o ex-deputado federal Sr. Pedro Correa, líder do Partido Progressista, como o responsável por repassar a propina para o partido, estimada em cerca de R$ 40.700.000,00 entre 2004 e 2014. Além do mais, tais valores teriam sido introduzidos na economia com aparência lícita (lavagem de dinheiro).
Para dissimular o valor da corrupção, Pedro Correa depositava parte do dinheiro em contas bancárias de terceiro, como fez com o seu chefe de gabinete Ivan Vernon.
Assim, determinou o Juiz Sérgio Moro (fl. 83):
“Como adiantado, Ivan Vernon não foi denunciado pelo crime de corrupção, mas por lavagem. Entendo que agiu dolosamente ao ceder sua conta para que Pedro Correa pudesse receber valores decorrentes do esquema criminoso da Petrobrás. Era um assessor de confiança de Pedro Correa. É possível que não tivesse conhecimento de detalhes do esquema criminoso da Petrobrás. Entretanto, o recebimento em sua conta de depósitos, em seu conjunto vultosos, sem origem identificada e estruturados, era suficiente para alertá-lo da origem criminosa dos recursos recebidos. Isso especialmente quando tornado notório a partir de 2006 que Pedro Correa, com a cassação de seu mandato parlamentar, estava envolvido em atividades criminais.”
Logo, Moro frisa que não há provas de que Ivan Vernon soubesse do esquema, no entanto, determinou a condenação dizendo que o réu teria agido com dolo eventual, por não rejeitar o pedido do seu chefe.
A questão reascende um velho debate no que diz respeito à possibilidade de admitir o dolo eventual como elemento subjetivo, que já era discutido desde quando o tipo penal foi criado. O ponto interpretativo está no § 2º do art. 1º, que define:
Art. 1º […]
§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:
I – utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal;
A questão é complexa, podendo ser encontradas posições na doutrina tanto admitindo o dolo eventual, quanto rechaçando a possibilidade de aceitar o “deveria saber” como elemento subjetivo.
O que de imediato se constata é que o legislador não deixou claro no caput do tipo penal a possibilidade de admitir o dolo eventual como elemento subjetivo. Ou seja, inexiste qualquer expressão que defina com precisão a hipótese de dolo eventual. Por este e outros motivos BADARÓ e BOTTINI (2012, p. 96) entendem que, para configurar o delito na forma do art. 1º, o agente deve estar plenamente consciente da procedência ilícita dos bens para lavagem de capitais. Da mesma forma CALLEGARI (2008, p. 152) reforça este entendimento alegando que “o autor atua porque conhece a origem criminosa dos bens e porque quer lhes dar aparência de licitude”.
Ainda que existam posições contrárias na doutrina – admitindo o dolo eventual – em 2012, quando do julgamento da AP 470, o plenário do STF se viu compelido a analisar se admitia ou não a questão do dolo eventual nos crimes de lavagem de dinheiro. Nesse sentido, em se tratando de fatos ocorridos antes da reforma legislativa de 2012, por maioria, os Ministros fixaram o entendimento (veja aqui) de que não se pode admitir o dolo eventual como elemento subjetivo ao tipo, pois, assim agindo, estaria se banalizando o tipo penal da lavagem de dinheiro.
Em suma, o fundamento do magistrado da Operação “Lava Jato” é contrária a posição firmada pelo Supremo Tribunal Federal quando analisou está matéria, até porque, para configurar o crime de lavagem de dinheiro é necessária a existência de um crime antecedente, sendo forçado concluir a possibilidade de dolo eventual.

Referências

BOTTINI, Pierpaolo Cruz; BADARÓ, Gustavo Henrique. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais: comentários à Lei 9.613/98, com alterações da Lei 12.683/2012. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
CALLEGARI, André Luís. Lavagem de dinheiro: aspectos penais da Lei 9.613/98. 2. Ed. Ver. Atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
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COMENTÁRIOS DO BLOG:


O Brasil perdeu a muito tempo a noção do absurdo.
A imbecilidade impera em todas as instituições alimentada por degeneração crônica da moral que leva a putrefação generalizada e mortal da sociedade saudável.
O remédio vai ter que ser a altura dos absurdos nefastos onde advogados de defesa já se transformaram a muito tempo de cúmplices a chefes do crime organizado.
Pena de morte é pouco. Só mais um pouquinho e vão conseguir inculcar na cabeça do povão que o Juiz Sérgio Moro é o canalha dessa questão.

Boa sorte. Vai que cola. 


A interpretação do ilustre juiz, com a qual concordo, é razoável e fulcra-se em boa doutrina. Os julgadores de instâncias inferiores não são obrigados a seguir a jurisprudência das supriores, nem mesmo do STF o qual não proclamou o seu entendimento a esse respeito, em súmula vinculante.

Pelo que depreende-se do trecho da decisão do Juiz, depósitos vultuosos eram feitos pelo Deputado Pedro Correa na conta do seu chefe de gabinete, Sr. Ivan Vernon. Esse último, foi denunciado pelo MP por lavagem de dinheiro.

Embora tratar-se de crime doloso e que somente se consuma com o resultado (material), não é tema pacífico na doutrina a possibilidade de se admitir dolo eventual em tais delitos. Contudo, se o agente percebeu um certo perigo, é possível que tenha agido na esteira do elemento subjetivo.

Fica difícil não perceber a ilicitude em reiterados depósitos vultuosos em sua conta corrente, feitas pelo seu chefe (que no caso tratava-se de um Deputado Federal, e que jamais, pelo menos em tese, precisaria da ajuda do seu subordinado para guardar dinheiro). Fica claro ai a percepção do perigo de agir por parte de Ivan Vernon.

É óbvio que não basta apenas uma certa consciência da ilicitude, mas a percepção de um perigo real quando dessas transações financeiras. Imagina seu chefe depositando grandes quantias em dinheiro na sua conta corrente, realizando saques e novos depósitos. Isso reiteradamente?

Como nos ensina Claus Roxin: "não basta uma consciência potencial, marginal, ou um sentimento. Deve-se averiguar se o agente percebeu o perigo de agir, e se assumiu o risco de contribuir para um ato de lavagem" (Derecho Penal)

E aguardar para assistirmos os recursos que virão.

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