Articulados como nunca, eles se dividem entre liberais e conservadores, mas se unem para fustigar a esquerda e criar um novo movimento político
O megafone está na prateleira de cima, exposto como um troféu no gabinete da Assembleia Legislativa. Foi com o aparelho a pilha que Marcel van Hattem, 29 anos, hoje deputado estadual do PP, acossou aos berros a petista Maria do Rosário no ano passado – os dois faziam campanha no Parque da Redenção, em Porto Alegre, quando o candidato levou o megafone à boca.
– Gostaria de dizer que a senhora nos envergonha! Porque a senhora defende bandido, e nós queremos a defesa da família! – gritava ele, enquanto um assessor gravava o inflamado discurso em vídeo, um bate-boca entre militantes começava, e Maria do Rosário preferia se afastar.
Não faltou quem achasse aquilo uma grosseria. O presidente do PP gaúcho, Celso Bernardi, telefonou para Van Hattem e classificou a provocação como irresponsável, um incentivo ao tumulto. A colegas mais próximos, disse que o episódio foi "uma oportunidade para o PT nos chamar de ditadores".
Só que em poucos dias o vídeo beirava 100 mil visualizações, passava de 5 mil compartilhamentos e recebia dezenas de comentários na linha "ganhou meu voto" no Facebook. É inegável que a estratégia deu certo: líderes do PT e do PP, além do próprio Van Hattem (foto abaixo), concordam que o embate com Rosário foi fundamental para sua boa votação: 35.345 votos.
Foto: Omar Freitas
De lá para cá, o deputado mais jovem da Assembleia repete a tática quase que diariamente: seus vídeos provocando parlamentares petistas – há sempre um assessor com celular por perto –, são um sucesso nas redes sociais. Essa receita de fustigar a esquerda em tom de fúria, conclamando cidadãos indignados com Dilma Rousseff, com o Foro de São Paulo, com o excesso de impostos ou com "a roubalheira do PT", é a face mais evidente de uma nova direita que cresce em ritmo galopante, com poder de articulação sem precedentes desde a redemocratização do Brasil.
– Antes, só a esquerda falava alto. Chegou o momento de confrontá-la. Havia muita gente órfã de um posicionamento mais firme em relação ao estado das coisas a que chegamos – afirma Van Hattem, filho de um engenheiro holandês e de uma arquiteta paulista que, após se conhecerem em um congresso luterano, casaram-se em Dois Irmãos, onde o menino cresceu e se elegeu vereador aos 18 anos.
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Quase a mesma idade do paulista Kim Kataguiri, que tem apenas 19 e desponta como principal líder do Movimento Brasil Livre (MBL) – em oito meses de existência, o grupo fundou diretórios em 173 cidades brasileiras e convocou manifestações que levaram às ruas centenas de milhares de pessoas pedindo o impeachment da presidente.
Com o crescimento do MBL, Kim abandonou a faculdade de Economia na Universidade Federal do ABC. Decidiu dedicar-se com mais afinco ao movimento e às palestras que ministra país afora, ensinando formas de levar ideias liberais a jovens pouco engajados na política. No fim deste mês, a convite da respaldada organização Cato Institute, vai expor suas visões em quatro painéis em Washington, nos Estados Unidos. Para o Natal, está previsto o lançamento de seu primeiro livro, ainda sem nome, pela editora Record, uma das maiores do país.
– Continuo lendo sem parar. Só parei de estudar formalmente porque as faculdades de Economia no Brasil são muito atrasadas, ainda dominadas por uma visão de esquerda. Dificilmente você encontrará uma cadeira sobre a Escola Austríaca, por exemplo – avalia Kim, mencionando os maiores ídolos do pensamento econômico dessa jovem direita: Ludwig von Mises (1881-1973) e Friedrich Hayek (1899-1992), dois entusiastas do livre mercado e do Estado minúsculo.
Foto: Diego Vara
Mas a fonte de renda fixa de Kim Kataguiri (foto acima), o canal Inimigos Públicos, no YouTube, passa menos pela menção aos teóricos e mais pela surra no PT. Ou em qualquer arauto da esquerda. O mês que rendeu mais dinheiro ao líder do MBL foi abril, quando seu vídeo chamando de "figura patética" o deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) – que dias antes o havia classificado como "analfabeto político" – atingiu 650 mil acessos. Sua participação nos lucros com os anúncios publicitários veiculados pelo YouTube neste vídeo passou de R$ 5 mil.
Ao contrário do que se poderia pensar, Kim é a favor do casamento gay, bandeira medular de Jean Wyllys. E esta é uma das principais divisões entre os novos direitistas: o chamado liberalismo de costumes. Boa parte é a favor dos princípios liberais apenas na economia, pregando uma radical reforma tributária, o fim da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a privatização de estatais e até a redução da pobreza – mas por meio de empregos, de um mercado superaquecido, de impostos menores sobre alimentos e remédios, e nunca por meio de transferência de renda. Agora, quando o assunto é família, nem sempre a tal liberdade prevalece.
– Só que outra boa parte, na qual me incluo, entende que o liberal contrário ao casamento gay está em absoluta contradição – diz Hélio Beltrão, 48 anos, presidente do Instituto Mises, uma das cerca de 30 organizações liberais que pipocam no Brasil desde o fim da década passada (informação importante: eram apenas três em 2005), promovendo cursos e debates sobre liberalismo. – O liberal de verdade defende trocas voluntárias e, se você quer trocar afeto com quem quer que seja, se busca um acordo comum entre seus bens e de outra pessoa, não há como um liberal ser contra.
No mês passado, Marcel van Hattem vociferou na tribuna da Assembleia contra a proposta do governo federal de discutir "identidade de gênero" em salas de aula – a ideia, em linhas gerais, era conscientizar estudantes sobre as diversas orientações afetivas e proteger do bullying alunos gays ou transexuais. Van Hattem subiu o tom ao dizer que "é dever da família educar seus filhos":
– Querer, dentro da escola, dizer que homem não é necessariamente homem, querer incutir isso na cabeça das crianças, é um crime, é uma afronta!
Foto: Ricardo Duarte
Por isso Hélio Beltrão (foto acima), presidente do Mises, salienta que ficaria "muito brabo" se este texto o identificasse como um homem de direita. Ele afirma ser "um liberal e ponto".
– Sou a favor do casamento gay, a favor da legalização das drogas, discuto a propriedade intelectual, odeio aquela conversa de "bandido bom é bandido morto" e detesto autoritarismo. Como é que vou ser de direita? – questiona ele, um privatista inveterado que defende até a gestão do Bolsa Família por empresas privadas.
Embora Kim Kataguiri e Van Hattem jamais se oponham ao termo "direita" para etiquetá-los, no Brasil a definição tem, de fato, certa conotação pejorativa: regimes autoritários como a ditadura militar, além do antigo coronelismo, sempre foram identificados com valores direitistas.
Não surpreende que o Partido Novo, idealizado pelo engenheiro e ex-executivo de bancos João Dionísio Amoedo, também fuja do incômodo rótulo. Com as 492 mil assinaturas necessárias já colhidas, aguardando homologação do Tribunal Superior Eleitoral, o coordenador da legenda em Porto Alegre, Carlos Alberto Molinari, 33 anos, prefere que os interessados pela ideologia do Novo entrem no site e tirem suas conclusões:
– Você acha correto que os Correios tenham o monopólio sobre a entrega de correspondências? Acha correto que apenas meia dúzia de empresas possam prestar serviço de transporte público em uma capital? A livre concorrência diminuiria os preços, e só o cidadão seria beneficiado – prega Molinari.
Em tempo: até o início da campanha presidencial, quando PT e PSDB reforçaram suas atuações nas redes sociais, nenhuma sigla tinha mais curtidas no Facebook do que o ainda inexistente Partido Novo. Hoje, são mais de 800 mil, contra pouco mais de 900 mil do PT. O que está havendo com o partido que tradicionalmente mais mobilizava militantes?
– O PT está velho. Eu, que sou a figura proeminente do PT, tenho 69 anos, estou cansado, já estou falando as mesmas coisas que falava em 1980 – disse o ex-presidente Lula em discurso um mês atrás.
– Quando um vácuo se abre, quando há uma insatisfação geral com o sistema político, alguém tem que ocupar o espaço – conclui o cientista político Fernando Filgueiras, da Universidade Federal de Minas Gerais.
A nova direita – ou os novos liberais, como queiram – correm para ser a bola da vez.
CADA UM NO SEU QUADRADO
Direita: liberdade
Em geral, entende que os indivíduos são diferentes uns dos outros. Portanto, todos devem ter liberdade para alcançar suas metas da forma como acharem melhor, podendo alguns se destacarem mais do que outros de acordo com os méritos próprios.
Esquerda: igualdade
Tem como princípio a visão de que o ser humano só consegue se destacar com a ajuda do coletivo, da colaboração de todos. Portanto, não é justo que alguns tenham destaque ou posição social muito superior a outros. Deve-se buscar certa igualdade.
O liberal
Prega que o Estado interfira o mínimo possível na vida das pessoas. Só uma economia sem regulação estatal pode garantir que o indivíduo exerça de fato sua liberdade e suas plenas capacidades. No campo pessoal ou afetivo, cada um faz o que acha melhor.
O liberal-conservador
É liberal no plano econômico, mas, no âmbito familiar e pessoal, mantém ideias conservadoras. Ou seja, entende que a sociedade tem tradições que envolvem idioma, religião, costumes e convenções que precisam ser respeitados e protegidos.
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