Um novo e grande desafio depois do Afeganistão
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Desde os atentados de 11 de setembro de 2001, a prioridade dos Estados Unidos na Ásia Central tem sido derrotar o Talibã no Afeganistão. Mas enquanto os americanos e a OTAN se retiram, um novo perigo se manifesta: a possibilidade de o Ocidente se envolver com rivalidades regionais, lideranças políticas locais e situações de embate com a Rússia e a China.
Por anos, os governos da Ásia Central procuraram manipular o interesse de potências estrangeiras na região em benefício próprio. No verão de 2005, o exército dos Estados Unidos foi expulso de sua unidade em Karshi-Khanabad, no Uzbequistão, depois que autoridades americanas criticaram o governo por ter massacrado centenas de manifestantes da oposição em Andijon; a Rússia e a China, que têm expandido seu alcance na região, ambas apoiaram publicamente a repressão.
Em 2009, o cleptocrático presidente do Quirguistão, Kurmanbek S. Bakiyev, motivou uma guerra de lances entre Washington e Moscou quanto ao destino da base aérea Manas, a principal unidade de testes das tropas americanas no Afeganistão. Após a queda de Bakiyev em uma revolta ocorrida em abril de 2010, as autoridades quirguizes alegaram que muitos desses pagamentos foram submetidos a lavagem através de uma complexa rede de contas bancárias estrangeiras controladas pelo ex-presidente e sua família.
À medida que os Estados Unidos começam a se retirar do Afeganistão, é provável que os países da Ásia Central aumentem a demanda por compensações tácitas para cooperar. Atualmente, os Estados Unidos pagam ao governo do Quirguistão 60 milhões de dólares por ano pelo arrendamento de Manas e canalizam centenas de milhões de dólares em contratos de combustível para os fornecedores e intermediários locais.
Os Estados Unidos também pagam cerca de 500 milhões de dólares por ano em taxas de trânsito para transportar armamento e materiais pela Rede de Distribuição do Norte, um conjunto de rotas rodoviárias, marítimas, ferroviárias e aéreas que atravessam os países da Ásia Central, aberto para fornecer uma alternativa às rotas de abastecimento paquistanesas.
Em junho, a OTAN fechou acordos com o Uzbequistão, o Quirguistão e o Cazaquistão para retirar seu armamento do Afeganistão. O Uzbequistão, que controla efetivamente os embarques ferroviários que partem do norte do Afeganistão, já anunciou que irá cobrar até 150 por cento das taxas de trânsito vigentes da rede de distribuição, e as autoridades americanas esperam ser ainda mais pressionadas enquanto os estados vizinhos se mostram negociadores rígidos, no momento em que o Ocidente bate em retirada.
O que é mais controverso em toda a situação é o fato de que a OTAN e os países da Ásia Central ainda estão negociando quanto à possível transferência do armamento militar usado pelas forças de coalizão no Afeganistão para serviços de segurança de governos da Ásia Central, que têm um histórico sangrento no que diz respeito a direitos humanos.
Em janeiro, o governo Obama decretou a proibição da venda de artigos militares para o Uzbequistão por razões de segurança nacional, com vistas à viabilização da venda de armamento contraterrorismo. As autoridades americanas insistem que tais transferências futuras incluem apenas itens não letais, mas o governo uzbeque há muito tempo procura itens como veículos blindados, helicópteros e veículos aéreos não tripulados, que poderiam ser usados para coibir protestos.
A partida do Afeganistão também aumenta o risco de que os Estados Unidos, juntamente com outros poderes externos, sejam arrastados para uma série de disputas locais e crescentes rivalidades regionais. Durante a última década, líderes da Ásia Central têm evocado sistematicamente o espectro de insurgentes vindo do Afeganistão para justificar as suas próprias iniciativas de contraterrorismo e a necessidade de cooperação para fins de segurança com a Rússia, a China e os Estados Unidos. A retirada ocidental vai instigar o sentimento de medo nas elites locais, justificando a repressão doméstica, a rendição de adversários políticos e o aumento na tensão nas fronteiras com os países vizinhos.
Recentemente, o governo tadjique reprimiu milícias locais na remota cidade de Khorog, perto da fronteira afegã. Embora o governo alegue que capturou combatentes treinados no Afeganistão durante suas ações de repressão, os moradores veem a medida como uma tentativa de dominar o lucrativo contrabando na fronteira com o Afeganistão e, finalmente, de colocar a região autônoma sob o completo controle estatal.
A Rússia parece disposta a respaldar essa narrativa para justificar a expansão de suas bases militares pelo país afora, as quais, é muito provável, as autoridades tadjiques usarão como pretexto para exigir uma intensificação na ajuda oferecida pelo Ocidente.
A medida de Washington conhecida como estratégia da 'nova rota da seda', uma tentativa de promover o desenvolvimento sustentável no Afeganistão por meio de uma ligação entre a infraestrutura, redes de transmissão de energia e dutos do país com a Ásia Central, pode levar a casos de corrupção e enriquecimento das autoridades mais poderosas. A promoção de projetos dispendiosos, apresentados de modo muito grandioso, já provocou suspeitas em Pequim e Moscou a respeito das ambições regionais do Ocidente a longo prazo.
Além disso, a Rússia continua a defender a inclusão do Quirguistão e do Tajiquistão na nova união aduaneira liderada por Moscou, enquanto a China mantém a construção de novas infraestruturas e oleodutos. Longe de promover a intensificação do comércio regional, os países da Ásia Central parecem agora estar se beneficiando de iniciativas econômicas externas para arrecadar novas receitas.
Após passar 11 anos pressionando o governo afegão para aperfeiçoar a sua administração e criar instituições democráticas, Washington não conseguiu promover efetivamente esses mesmos objetivos nos países vizinhos. Agora, a retirada americana do Afeganistão periga arrastar o Ocidente para um foco ainda mais tenso de lutas de poder internas e rivalidades regionais.
(Alexander Cooley, professor de Ciência Política da Faculdade Barnard, é autor de 'Great Games, Local Rules: The New Great Power Contest in Central Asia' – 'Grandes disputas, regras locais: A nova grande luta por poder na Ásia Central'', em tradução livre.)
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