PSICOPATAS NO TRABALHO
Confiantes e
carismáticas, mas também ambiciosas e indiferentes aos sentimentos dos outros,
pessoas com o transtorno de personalidade dissocial são ardilosas e, às vezes,
sobem na carreira passando por cima de muita gente.
Revista Scientific American
- Por Senya Müller
Gustavo logo de cara
percebeu que Dênis era a pessoa certa para o cargo. O jovem inteligente
impressionou o chefe da seção com uma aparência segura e uma boa retórica.
Narrou de forma minuciosa seus inúmeros méritos e experiências, apesar da
aparente pouca idade. Gustavo, fascinado pelas qualidades do homem à sua
frente, o contratou. Algum tempo depois se arrependeria amargamente. Como se
comprovou, muitas das qualificações de Dênis eram inventadas. Pior, era
evidente que a palavra compaixão não existia em seu vocabulário. Insolente e
ambicioso buscou um cargo de chefia até destituir Gustavo de seu posto.
Indivíduos com esse tipo de comportamento
foram denominados pelo psicólogo canadense Robert Hare como
"psicopatas". Na opinião do professor da Universidade da Colúmbia
Britânica, Vancouver, Canadá, funcionários como Dênis - aliás, um caso real
numa empresa americana - podem ser identificados com esse tipo de transtorno
clínico. O termo psicopata, porém, não é mais usado por alguns grupos de
profissionais na Europa. Na tentativa de amenizar o que receiam ser um termo
discriminatório, adotaram a designação "personalidade dissocial".
Associações com o canibal
Hannibal Lector, do filme O silêncio dos inocentes, não estão totalmente fora
de propósito. O personagem, interpretado pelo ator Anthony Hopkins, pode ser
considerado um exemplo extremo desse transtorno. É típico da personalidade dissocial
um crônico desrespeito às regras sociais, falta de cuidado com seus semelhantes
e total indiferença em relação aos sentimentos dos outros. Muitas das pessoas
diagnosticadas com esse transtorno são propensas a um comportamento agressivo e
violento. Não por acaso personalidades dissociais representam grande parte dos
criminosos de alta periculosidade que estão na cadeia.
Segundo as avaliações de
Hare, o transtorno apresenta-se em diferentes graus. Logo, nem todas as
personalidades dissociais serão violentas e se tornarão criminosos. Por sorte,
a forma mais branda é a mais difundida: Indivíduos como Dênis, que desrespeitam
as regras sociais, mas não afrontam o Código Penal.
SERPENTES
DE TERNO E GRAVATA
O psicólogo parte do
pressuposto de que o número desses "psicopatas de escritório" de
difícil reconhecimento aumenta nos cargos de chefia. Nesse posto - como no caso
de Dênis -, eles costumam tiranizar seus colegas e alguns chegam até a causar
grandes prejuízos financeiros. Em outra pesquisa feita entre 1995 e 2000 o
psicólogo nova-iorquino Paul Babiak mostrou como essas pessoas disputam altos
cargos e salários. Ele analisou o quadro de funcionários de três empresas
americanas de porte médio e descobriu, na equipe executiva, três personalidades
dissociais: Uma delas era Dênis.
O novo empregado, que ao
menos na aparência prometia ser excelente, após algumas semanas apenas começou
a chamar a atenção de todos, de forma bastante desagradável. Sem motivo,
queixou-se de uma secretária, reconhecida por ser superconfiável e responsável,
chamando-a de "incompetente e atrevida". Foi um primeiro alerta.
Quando Dênis começou a faltar a várias reuniões sem uma justificativa razoável,
Gustavo passou a se questionar se havia feito a melhor escolha. Após um ano ele
descobriu que Dênis havia desviado dinheiro da empresa. Questionado sobre onde
estariam os recursos, deu respostas evasivas e mentiu. Fatos como esses se
tornaram comuns. Gustavo, desconfiado, decidiu procurar a presidência da
empresa só para ter certeza de que o funcionário já havia se queixado dele
também. Mas foi ignorado enquanto o presidente era só elogios ao novo e
esforçado talento da empresa. Por fim, Dênis tornou-se chefe. E Gustavo foi
transferido a um posto inferior. As conseqüências do estudo de caso de Babiak
assemelham-se em vários aspectos às táticas de personalidades dissociais no
mundo corporativo. Ele distinguiu cinco fases.
- Fase I: Ingresso na
empresa
Primeiro, na entrevista de
emprego, o candidato mostra-se cativante, charmoso e seguro.
- Fase II: Avaliação
Uma vez empregado; procura
descobrir, o mais rápido possível, quem tem voz ativa na empresa. Depois,
constrói relações pessoais, às vezes íntimas, com funcionários influentes.
- Fase III: Manipulação
De modo intencional, espalha
falsas informações para que seja visto de forma positiva e os outros, de
maneira negativa. Semeia desconfiança entre funcionários, contando aos colegas
que outros os teriam difamado. Assim, cria contato individual com as pessoas.
Mas evita reuniões, nas quais precise se posicionar diante do grupo.
- Fase IV: Confrontação
Quando não são mais úteis à
sua escalada profissional ele abandona as pessoas que havia cortejado. Em
geral, suas vítimas são humilhadas. E, quanto mais exploradas, menos se dispõem
a falar sobre suas experiências.
- Fase V: Ascensão
Por fim, aplica o golpe.
Coloca os chefes uns contra os outros e toma o lugar de seu superior.
Segundo especialistas como o
psicólogo Delroy L. Paulus, da Universidade da Colúmbia Britânica, a ausência
de medo e de consciência é o que faz personalidades dissociais serem
potencialmente tão ardilosas. Essas características possibilitam aos indivíduos
infringir as normas e externar suas agressões sem qualquer bloqueio ou
escrúpulo. Robert Hare mostrou em uma pesquisa recente que elas não deixam
transparecer nenhum sinal físico de medo. Ele analisou um grupo de voluntários,
anteriormente diagnosticados com transtorno de personalidade dissocial, e um
grupo de controle sem o distúrbio. Ambos deveriam observar um cronômetro, que marcava
de dez a zero. No zero, um inofensivo, mas doloroso choque elétrico seria
liberado. Os voluntários do grupo de controle demonstraram, durante a contagem
regressiva, sinais psicológicos de medo crescente, como sudorese e aumento da
pulsação. Em personalidades dissociais essas reações não se manifestaram.
COMPAIXÃO
ZERO
Em 2003, Ray Dolan,
pesquisador do Instituto de Neurologia da Universidade College de Londres,
comprovou que falta a esses indivíduos não só a capacidade de temer como também
qualquer forma de compaixão. Ele chegou a essa conclusão ao comparar o que
ocorre na amígdala, estrutura que reage a informações que despertam emoções. Em
geral, ela é ativada quando se vêem imagens de pessoas tristes ou que passam
por necessidades. No entanto, no grupo diagnosticado com transtorno de
personalidade dissocial não foi identificado nenhum aumento de atividade da
amígdala. "Em geral, a empatia ocorre de forma automática e não pode ser
controlada segundo sua vontade. Quando vemos alguém sofrendo, sentimos
compaixão, querendo ou não", explica Dolan. Por isso, o neurologista
suspeita que a ausência dessa reação seja congênita.
Indivíduos com transtorno de
personalidade dissocial não percebem seu próprio comportamento nem como
anomalia nem como um problema pessoal. Como só pode ser curado quem assim o
deseja, uma terapia nesses casos não surte efeito. Outra característica das
pessoas com personalidades dissociais é que não sofrem de alucinações
auditivas, ou seja, obediência a "vozes" internas que lhes ditam
ordens. Por isso, em muitos países, são considerados indivíduos com
responsabilidade penal. Mas a pena não surte efeito. "Essas pessoas
infringem regras de forma consciente. Elas nada sentem ao transgredi-las",
explica Hare, que há mais de 35 anos trabalha com detentos. “Eles se julgam no
direito de fazerem o que querem, pois se orientam por seu próprio sistema de
valores.” De forma análoga, a grande experiência de Hare e de outros psicólogos
mostra que personalidades dissociais são imunes a qualquer tipo de pena. Mesmo
após ficarem anos na prisão costumam ser mais reincidentes do que outros
criminosos. Quando não entram em conflito com a lei, costumam deixar o clima
carregado no trabalho. Se profissionais sem escrúpulos atingem cargos de
chefia, fica difícil combater suas intrigas.
Por isso, Hare e Babiak, no
Canadá e nos Estados Unidos, decidiram ajudar empresas a reconhecer
funcionários com personalidade dissocial. Eles criaram um método psicológico
que poderá identificar os supostos "psicopatas de escritório" ainda
no processo de seleção. O questionário "B-Scan 360", em fase de
testes, retoma o catálogo de sinais diagnósticos de "psicopatas"
criado em 1941 pelo psicólogo Hervey Cleckley. Hare o adaptou com base nos
resultados de seus estudos, transformando-o no chamado "Psycopathy
Checklist Revised", conhecido como PCL-R. O B-Scan 360 registra o grau de
manifestação de características críticas por meio de várias perguntas. Detalhe:
O questionário não é preenchido por quem procura emprego e sim por ex-colegas e
ex-chefes. ''Em um teste convencional, no qual eles mesmos respondem às
questões, a pessoa com personalidade dissocial cria as respostas para obter o
melhor resultado possível. “Esse é um de seus maiores talentos, com os quais
eles sempre conseguem impressionar suas vítimas”, explica Babiak. Com base nos
dados recolhidos, os psicólogos Hare e Babiak pretendem alertar os empregadores
sobre o fato de que aparentes qualidades relacionadas à liderança - como
confiança e persuasão e demonstração de frieza - podem ocultar tendências
patológicas.
- TESTE DE ADMISSÃO
B-SCAN 360
O teste
revela "psicopatas no trabalho" segundo os seguintes indícios:
a) Charme superficial
b) Mentira patológica
c) Sede de estímulos
d) Tendência ao desânimo
e) Caráter manipulador
f) Falta de sentimentos de culpa
g) Afetos superficiais
h) Falta de empatia
i) Estilo de vida parasitário
j) Falta de controle emocional
k) Promiscuidade
l) Transtorno de comportamento desde a infância
m) Criminalidade precoce
n) Impulsividade
o) Carência de objetivos realistas a longo prazo
p) Ausência de senso de responsabilidade
q) Incapacidade de admitir seus próprios erros
r) Casamentos pouco duradouros
a) Charme superficial
b) Mentira patológica
c) Sede de estímulos
d) Tendência ao desânimo
e) Caráter manipulador
f) Falta de sentimentos de culpa
g) Afetos superficiais
h) Falta de empatia
i) Estilo de vida parasitário
j) Falta de controle emocional
k) Promiscuidade
l) Transtorno de comportamento desde a infância
m) Criminalidade precoce
n) Impulsividade
o) Carência de objetivos realistas a longo prazo
p) Ausência de senso de responsabilidade
q) Incapacidade de admitir seus próprios erros
r) Casamentos pouco duradouros
O psicólogo organizacional
Michael Frese da Universidade Giessen, Alemanha, tem dúvidas de que o B-Scan
seja um instrumento eficaz e ético. "Um funcionário exprimir sua opinião
sobre um colega, dizendo que ele ambiciona poder e sucesso, beiraria a difamação.
Nem mesmo o conselho das empresas concordaria que aplicássemos tais
métodos", revela. Mas, no geral, Frese acha justificada a preocupação dos
cientistas americanos. "No mundo corporativo, personalidades dissociais
não são um fenômeno de massa. Mas em meus seminários sobre administração sempre
são citados alguns casos." Frese recomenda, em vez de um método de teste
padronizado, uma estratégia alternativa: "Se o candidato causa ceticismo
com um currículo ostensivo ou com inúmeras mudanças de cargo, o RH deve
conversar com o último empregador". Com perguntas habilidosas na
entrevista é possível aferir a veracidade de um currículo. Assim, superiores e
chefes de pessoal podem revelar dados falsos relativos à qualificação e à
experiência do candidato.
- CORPORAÇÕES
DOENTIAS
Mas como pessoas com
transtorno de personalidade dissocial conseguem ir tão longe na carreira e com
tanto sucesso profissional? É claro que os organogramas e a forma como as
empresas estão estruturadas colaboram para que indivíduos com comportamento
egocêntrico alcancem cargos de chefia. Babiak vê um motivo para o êxito de
algumas personalidades dissociais nas estruturas intrincadas de muitas
corporações. Em algumas delas, que crescem rapidamente e adotam constantes
mudanças de funcionários, as intrigas são dissimuladas por muito tempo. E uma
hora vêm à tona. Psicólogos organizacionais advertem para o fato de que as
próprias empresas podem abrigar uma estrutura doente e atrair funcionários com
qualidades semelhantes. Nesse contexto, aliás, Hermann Speckmann, da Associação
Nacional Especial de Trabalho Social Empresarial da Alemanha, fala de uma
autêntica patologia organizacional. "Empresas doentes tendem a empregar
pessoas que combinem com sua estrutura e exigem delas o mesmo tipo de
personalidade. Assim, reforça-se o estilo inescrupuloso corporativo."
Como constata Michel Frese,
filosofias empresariais que não se guiam dessa forma enfrentam igual dilema.
Hoje, muitos especialistas preferem uma estrutura administrativa baseada na
confiança, onde não haja vigilância rígida sobre os funcionários. E, assim,
estimulam um ambiente profissional com maior liberdade. "É um cenário
positivo, claro. Mas é exatamente dessas estruturas que personalidades dissociais
costumam se aproveitar."
Já que na vida profissional
atual valores como força, capacidade de persuasão e controle das emoções estão
em alta, à primeira vista as características desses indivíduos são uma
vantagem. "A capacidade de exercer poder é entendida como algo positivo
pelos executivos", segundo Frese. "Carisma é um conceito relacionado
aos valores de uma sociedade. Se alguém os incorpora ou finge incorporá-los,
somos facilmente atraídos." É fundamental, portanto, analisar de forma crítica
o que pode estar por trás de um belo e eficiente currículo. A presença de
psicólogos nas empresas pode ser um diferencial.
O QUE FAZ DE UM INDIVÍDUO
UM "PSICOPATA"?
Segundo a Classificação
Internacional de Transtornos Psíquicos (CID), o que chama atenção no transtorno
de personalidade dissocial, é a grande discrepância entre comportamento e
normas sociais vigentes. Suas principais características são:
1. Ser alheio aos sentimentos - em especial ao sofrimento
- dos outros.
2. Clara e constante falta de responsabilidade e desacato
às normas sociais, regras e obrigações.
3. Incapacidade de manter relações duradouras, mas nenhuma dificuldade em
adquirir novos e múltiplos relacionamentos.
4. Pouquíssima tolerância a frustrações e tendência ao comportamento agressivo
e violento.
5. Incapacidade de experimentar consciência de culpa ou de aprender com a
experiência e, principalmente, com penalidades.
6. Tendência a culpar os outros e a dar explicações superficiais do próprio
comportamento condenável.
Para
o diagnóstico, no mínimo três das características ou modos de comportamento
citados devem estar presentes. Estima-se que esse transtorno atinja entre 1% e
3% da população adulta. De acordo com Robert Hare, mulheres e homens são
afetados igualmente, mas eles tendem mais claramente a desenvolver a forma
violenta.
Importante: o transtorno
engloba modelos de comportamento enraizados e contínuos que se manifestam em
reações constantes a diferentes situações pessoais e sociais. Os homens agem
assim não apenas no trabalho, mas em todos os setores da vida, como na relação
com parceiros, fama e amigos. A pergunta sobre se esse transtorno de
personalidade pode ser considerado congênito ou se desenvolve em decorrência de
uma experiência traumática na infância ainda não foi respondida satisfatoriamente.
O neurologista Adrian Raine da Universidade do Sudeste da Califórnia de Los
Angeles supõe que a causa esteja na atrofia do lobo frontal, parte do cérebro
intimamente relacionada à regulação do comportamento.
Abraço e Sucesso a Todos
Olimpia Pinheiro
Responsável Comercial E-Commerce PDG (91)8164-1073 (skype)
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