Por Alexander Lobrano, The New York Times News Service/Syndicate
Durante muitos anos havia tantos restaurantes estrelados ao longo da Côte
d'Azur ‒ aquele trecho glamoroso de litoral também conhecido como Riviera
Francesa ‒ que a Michelin incluía um mapa no seu guia para mostrá-los com mais
detalhes. Hoje, porém, não são os salões suntuosos com garçons de smoking e
preços astronômicos as grandes estrelas, mas sim as casas pequenas, casuais e
aconchegantes, com chefs que trabalham com produtos regionais em cardápios
enxutos e rotativos – e a preços acessíveis.
No verão passado essa tendência se intensificou com o surgimento de vários
bistrôs, reforçando a reputação da costa mediterrânea como um dos melhores
lugares para se comer na França. Como acompanhei essas inaugurações de casa, em
Paris, achei que seria uma ótima desculpa para um fim de semana prolongado na
Riviera; assim, planejei um tour gastronômico de Nice a Antibes, tendo um amigo
de cada cidade a me acompanhar às refeições.
Como percebi em visitas anteriores, esse é um lugar excelente para comer, em
grande parte por ser um ímã de talentos culinários, atraídos tanto pela fartura
da região (frutos do mar e peixes recém-saídos do Mediterrâneo e frutas, legumes
e verduras recém-colhidos nas hortas das pequenas propriedades) como pela
clientela fiel de turistas e gourmets, sem contar que é um lugar lindo para se
morar. Aqui vão dicas dos meus lugares favoritos na Riviera.
Chat Noir, Chat Blanc
Escondido numa travessa atrás dos terraços ensolarados e lotados de turistas
que dão vista para o mercado de Cours Saleya, em Nice, fica o minúsculo bistrô
de Giorgio Grilenzoni, que o chef milanês abriu em 2010 e serve pratos
deliciosos e modernos da cozinha mediterrânea ‒ e, se você tiver a sorte de
conseguir uma das três mesas na calçada, ainda consegue apreciar um pouco da
vida diária do bairro.
Almoçando sozinho, sentei com meu copo de vinho branco e examinei a cena ao
meu redor. Todo mundo no bairro adora Grilenzoni e a recíproca é verdadeira.
Empurrando sua bicicleta amarela, o carteiro entregou a ele a correspondência,
dizendo alegremente: "Pas de factures!" (nenhuma conta). Um vendedor veio lhe
entregar os tomates que não foram vendidos no mercado e o vendedor de
especiarias na loja vizinha parou para bater papo. "Apesar de ser um vilarejo, a
boa e velha Nice é incrivelmente internacional", Grilenzoni me disse. "O que
temos em comum é o amor pela boa comida."
Grilenzoni e Nicola Sikic, que prepara as sobremesas e administra o salão,
trabalharam no sofisticado La Reserve quando o chef finlandês Jouni Tormanen
comandava a cozinha ‒ e embora o chef cozinhe na Côte d'Azur, tem muito orgulho
de suas raízes italianas, como prova o cardápio de hoje: como entrada, foie gras
com cerejas pretas, seguida por um risoto soberbo coberto por um molho
encorpado, encimado por dois camarões "pedaçudos" e um buquê de rúcula.
"Os franceses não entendem que não se deve colocar creme fresco no risoto – a
cremosidade vem do amido no arroz", disse ele, incrédulo, enquanto eu terminava
minha refeição com um delicioso tiramisù, "mas dou um desconto por causa dos
queijos maravilhosos que fazem".
Chat Noir, Chat Blanc, 20, rue Barillerie, Nice; (33-4)
93-80-28-69; chatnoirchatblanc.com. Almoço para duas pessoas, sem bebidas nem
gorjeta, sai por cerca de 60 euros (cerca de US$ 78). Fechado para o almoço de
sábado e domingo.
O que não falta em Nice são velhinhas de sapatilhas de lamê dourado passeando
com seus cachorros, mas, pelo que vi na minha última visita, a elas se juntaram
jovens de óculos caros e roupas esportivas italianas para conferir o Flaveur,
que ganhou uma estrela do Michelin em 2011. A própria cidade parecia energizada
pelo cardápio, um exemplo delicioso de uma cidade rejuvenescida.
O Mediterrâneo sempre foi um caldeirão de intercâmbio culinário, onde
sabores, ingredientes e técnicas passaram de uma região à outra graças ao
comércio e às conquistas da região. Hoje, porém, muitos dos jovens chefs da
Riviera vão buscar inspiração mais longe ‒ entre eles, Gael e Mickael Tourteaux,
os irmãos que dominam as panelas da pequena cozinha dessa casa de frente para o
mar.
Gael, o mais velho, nasceu em Reims, e Mickael, em Guadalupe; ambos treinaram
com dois dos mestres da Riviera – Alain Llorca, que já foi chef do Le
Chantecler, no Hotel Negresco, em Nice, e agora abriu o Alain Llorca em
St.-Paul-de-Vence e o japonês Keisuke Matsushima. Por isso, não foi surpresa ver
o cardápio cheio de pratos originais, sabores asiáticos e ingredientes
provençais.
Como por exemplo o primeiro prato, delicado, mas intenso: salmão com molho de
abacate e maçã, gelatina de limão kaffir e rougail (molho de tomate com
gengibre). A seguir, carne Angus fatiada servida com cogumelos e agrião e um
consomê de cebola, reforçado por um toque de satay, o molho de amendoim
asiático; depois, bacalhau cozido no missô e servido com frutas cítricas e, para
finalizar, um cheesecake de coco sensacional, acompanhado de abacaxi congelado e
raspas de limão.
Flaveur, 25, rue Gubernatis, Nice; (33-4) 93-62-53-95; flaveur.net. Almoço a
29 ou 37 euros; jantar, 45 ou 70 euros. Fechado para o almoço de sábado, domingo
e segunda.
Cagnes-sur-Mer não é uma atração turística do porte da vizinha Nice, o que
Jacques Maximin, de 64 anos, acha ótimo. Depois de uma carreira assombrosa, em
que trabalhou com Roger Verge no Moulin de Mougins, perto de Cannes, e ganhou
duas estrelas do Michelin no Le Chantecler, em Nice, ele abriu o primeiro
restaurante, o Theatre Jacques Maximin, num antigo teatro de Nice, em 1989. "A
simplicidade é o segredo da felicidade e também da boa comida", disse Maximin, a
quem o badalado chef espanhol Ferran Adrià chama de "mentor".
Em 2010, Maximin reabriu o Le Bistrot de la Marine, que ocupa uma casa de
pescador de 1869 pintada de amarelo. "Eu queria um restaurante ao qual todo
mundo pudesse vir", disse Maximin. De fato, a opção de dois pratos por um preço
fixo (25 euros) que ele serve diariamente no almoço e no jantar é uma das
melhores ofertas da Riviera (há também opções à la carte). O chef ganhou uma
estrela do Michelin no ano passado, mas seu orgulho é a qualidade dos
ingredientes. "A maioria das pessoas ainda não entende que peixe selvagem hoje é
um luxo", disse ele, "mas espero que sinta no paladar a diferença".
A clientela do almoço de domingo é bem variada: um casal bem vestido, que
chegou num Bentley, sentou lado a lado de uma senhorinha loira acompanhada de um
padre, o neto tatuado e a namorada. Meu amigo e eu começamos à la carte com duas
entradas excelentes: ovos cozidos sobre beterraba fatiada, acompanhados de um
caldinho de framboesa e beterraba e uma sopa de tomate sublime cercada de uma
pequena ilha de tartare de robalo, amêndoas frescas e fava.
Depois, degustamos um prato que prova por que Maximin é um dos mestres no
preparo de peixes na França: um Saint Peter inteiro cozido numa caçarola de
cobre num molho "quatre quarts" – um clássico criado pelo chef com proporções
iguais de azeite, água, manteiga e suco de limão – com tomates, batatinhas,
azeitonas, funcho e tomilho. "O peixe, quando bem preparado, ganha realce no
sabor", disse ele com um encolher de ombros quando elogiei a receita.
Le Bistrot de la Marine, 96, boulevard de la Plage, Cagnes-sur-Mer; (33-4)
93-26-43-46;bistrotdelamarine.com. O cardápio a preço fixo sai por 25 euros; uma
refeição média à la carte para duas pessoas, por 150 euros. Fechado às segundas
e terças.
Quem quiser conferir o clima da antiga boemia que fez a Riviera famosa
décadas atrás tem que passar pela cidade velha de Antibes ‒ de preferência à
noite, quando os turistas já sumiram e os moradores lotam os terraços dos cafés,
iluminados pelas luzinhas das velhas árvores. Além da excelente cozinha
provençal, o astral acolhedor faz do L'Armoise um deleite.
Quando cheguei com meu amigo fotógrafo ao salão discretamente iluminado, num
domingo à noite, Amy Winehouse tocava no estéreo e o chef, Laurent Parrinello,
nos cumprimentou de trás do balcão de sua cozinha aberta. Para começar, um
garçom simpático nos serviu deliciosas fatias de polenta coberta com raspas de
trufas com nossos aperitivos.
Parrinello muda o cardápio – duas entradas, pratos principais e sobremesas –
semanalmente, de acordo com o que encontra no mercado. Nosso risoto de aspargo
com coulis de ervas estava impecável. Os pratos principais também são ótimos,
como o filé mignon de vitela com minicenouras, grapefruit e um "jus de viande"
encorpado, ou o robalo com pimenta piquillo e lascas de funcho. Durante a
sobremesa, acabamos batendo papo com uma bela cantora norueguesa e bebendo
champanhe até tarde – um desfecho típico da Riviera que faz jus à nova (e
excelente) gastronomia da região.
L'Armoise, 2, rue de la Tourraque, Vieil-Antibes; (33-4) 92-94-96-13. Menu
degustação a 40, 45 e 70 euros. Fechado às segundas.
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