CENSURA JUDICIAL/ECONÔMICA
POR OSWALDO VIVIANI















Relegado ao ostracismo após uma longeva vida política – na qual colecionou escândalos e virou sinônimo de corrupção na política brasileira –, o senador José de Ribamar Ferreira de Araújo Costa (PMDB), o “José Sarney”, de 83 anos, resolveu agora dedicar-se à censura judicial/econômica dos veículos da mídia que a ele não se curvam. A pedido do senador – que já declarou à revista Veja, em agosto de 2007, que sempre foi “defensor da liberdade de imprensa” e que “nunca” processou “nenhum jornalista” –, o blog da jornalista amapaense Alcinéa Cavalcante e este Jornal Pequeno tiveram contas bancárias bloqueadas, após decisões judiciais desfavoráveis.
Alcinéa, que tem como única renda sua aposentadoria de professora, sofreu, na quinta-feira (15), um bloqueio bancário de um valor que simplesmente não possui: R$ 2 milhões. O combativo JP – que depende exclusivamente de seus leitores e de propaganda normal e institucional, não fazendo parte de um império de Comunicação, como o Sistema Mirante – teve R$ 36,2 mil bloqueados, no último dia 2.
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Zé Sarney: poço de mágoas aos 83 anos
‘Danos morais’ – No caso do JP, José Sarney requereu indenização por “danos morais” de R$ 320 mil, alegando que o jornal divulgou reportagens, notas e artigos assinados que, segundo o senador, tinham por objetivo “atacar sua honra, mediante injúria, calúnia e difamação”. O processo (de nº 2008.01.1.153649-6) deu entrada em novembro de 2008, na 6ª Vara Cível da Justiça de Brasília. Em setembro de 2010, a juíza Grace Corrêa Pereira declarou improcedente a acusação do senador de que o JP atacou sua honra. “Julgo que o réu [Jornal Pequeno] atuou calçado no seu direito de opinar e criticar, não havendo propriamente insulto ou ofensa à dignidade do autor, tampouco violação à sua honra ou abuso algum a ser repreendido pelo Judiciário”, destacou a magistrada em sua decisão.
A juíza chegou a citar uma decisão do desembargador Ênio Zuliani, da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, ao examinar, em julho de 2009, um caso no qual um político reclamava de “campanha ofensiva à honra” movida pela revista Veja, fixou que “a desonra não resulta da publicação de um fato ou de um crime, mas sim do próprio fato ou do crime cometido”.


Apelou – O então presidente do Senado, inconformado com a decisão da Justiça, apelou à 4ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do DF e Territórios, que revisou a sentença da juíza Grace Pereira, e estabeleceu o pagamento, por parte do JP, de R$ 30 mil, valor ao qual posteriormente foram acrescentados juros e correção monetária, totalizando-se R$ 36,2 mil. O deferimento parcial da apelação de Sarney foi decidido pelos desembargadores Cruz Macedo (relator), Fernando Habibe (revisor) e Antoninho Lopes.
Para o advogado Abdon Marinho, que representa o JP, “está claro que, com os pedidos de bloqueio, o senador  Sarney tenta calar a mídia não alinhada a ele, buscando inviabilizá-la economicamente”.
‘Xô Sarney’ – O bloqueio de R$ 2 milhões na conta bancária da blogueira amapaense Alcinéa Cavalcante foi decidido pelo titular do Juizado Especial de Fazenda Pública e da 10ª Zona Eleitoral de Macapá, juiz José Luciano Assis.
O valor bloqueado refere-se a apenas alguns dos mais de 20 processos que José Sarney ganhou na Justiça contra Alcinéa, inclusive o referente à campanha “Xô, Sarney!”, criada e difundida no blog da jornalista, no pleito eleitoral de 2006 – na qual o maranhense Sarney reelegeu-se senador pelo Amapá, numa disputa apertada com a candidata Cristina Almeida.
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Jovem usa camiseta da campanha ‘Xô, Sarney!’, de 2006
O movimento “Xô, Sarney!” fez sucesso instantâneo, em blogs e outras mídias, nacionais e internacionais. Sarney considerou abusivos posts e comentários de leitores no blog de Alcinéa. Num deles, um leitor dizia: “Temos de mandar esse xibungo pro Maranhão. Somente assim faremos justiça àquela população pilhada há anos por uma família de jagunços que se utilizam dos métodos mais desprezíveis para combater qualquer um que cruze o caminho desses viciados em corrupção”.
Sempre misturando combatividade com bom humor, o Jornal Pequeno comentou, à época, na coluna “Informe JP”: “Nós, aqui do Maranhão, não aceitamos devoluções. Não adianta apelar para o Código do Consumidor: o prazo para devolver a mercadoria já prescreveu”.
Na quinta-feira (16), um dia após o bloqueio de sua conta bancária, a jornalista Alcinéa Cavalcante não fez nenhum comentário sobre a decisão judicial em seu blog. Apenas postou a letra da música “Apesar de você”, de Chico Buarque, e a seguinte frase: “Tentar me calar é tão inútil quanto tentar amarrar o sol à noite com a linha do Equador dentro do rio Amazonas”.
Osvaldo Aires Bade Comentários Bem Roubados na "Socialização" - Estou entre os 80 milhões  Me Adicione no Facebook