Um dos setores mais sensíveis da economia brasileira, o mercado de trabalho convive há alguns anos com um mistério. Enquanto as taxas de desocupação declinam até um patamar próximo a 5%, as despesas com o seguro-desemprego aumentam em percentuais até três vezes maiores. Esse fenômeno contraditório intriga especialistas e, de tão grave, levou a presidente Dilma Rousseff a protagonizar uma cena rara nos seus quase quatro anos de mandato. Há duas semanas, durante entrevista concedida a quatro jornais nacionais, depois de dizer que propostas de corte de ministérios para reduzir gastos são “lorota”, ela deu uma pista sobre onde identifica desperdício de dinheiro público. “O seguro-desemprego é um grande patrocinador de fraudes”, resumiu Dilma.
LÓGICA INVERSA
Se os níveis de emprego aumentam, as despesas deveriam cair.
Mas não é isso que acontece no Brasil
A franqueza da presidente encontra respaldo na realidade. Criado em 1986, pelo governo José Sarney, o seguro-desemprego é um benefício pago pelo governo, em até cinco parcelas, a quem foi demitido depois de, pelo menos, seis meses com carteira assinada nos últimos três anos. Pela lógica, se os níveis de emprego aumentam, as despesas deveriam cair. Mas não é isso que acontece. Em 2003, primeiro ano de mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, o seguro-desemprego custava R$ 6,6 bilhões aos cofres públicos. Em 2014, esse número saltou para R$ 35,2 bilhões e, para o ano que vem, deve atingir R$ 40,2 bilhões. Entre 2003 e 2013, os índices acumulados de inflação somaram 187%, enquanto as despesas com o benefício cresceram incríveis 383%.
Estimulada pela declaração de Dilma, ISTOÉ procurou órgãos públicos e especialistas para buscar explicações para o enigma. O governo atribui parte do aumento à política de valorização do salário mínimo, mas o número de beneficiários também deu um pulo. Pesquisas na área da economia do trabalho mostram que o aumento da demanda por mão de obra e as regras obsoletas para a concessão dos pagamentos criaram um mecanismo irregular de renda paralela. Em vez de amparar apenas os trabalhadores postos na rua de maneira involuntária, os pagamentos favorecem também pessoas que pedem demissão para ficarem paradas e receberem a remuneração, hoje fixada em valores que variam de R$ 724 a R$ 1.304 por parcela. Outros desistem do emprego formal e acumulam rendimentos obtidos em “bicos” não identificados pelo Ministério do Trabalho. Uma terceira vertente de distorção, mais grave, são as fraudes.
SALTO
Os gastos com o seguro-desemprego pularam de R$ 6,6 bilhões
no governo Lula para R$ 40 bilhões na gestão de Dilma
O seguro-desemprego virou alvo fácil para criminosos especializados em delitos contábeis. Em abril deste ano, investigações da Polícia Federal detectaram empresas de fachada que simulavam contratações de funcionários e faziam demissões em massa, para arrecadar recursos do benefício. Durante a Operação Canudos, deflagrada no município de Novo Hamburgo (RS), a PF prendeu uma organização criminosa que usava escritórios de contabilidade para realizar esse tipo de fraude. Dados cadastrais de mais de 60 empresas foram usados em crimes. A quadrilha arrecadava R$ 3 milhões por ano com as demissões fictícias.
Outras investigações da Controladoria-Geral da União (CGU) também apontam a alta rotatividade de funcionários do Ministério do Trabalho como um fator que facilita as irregularidades. Em quatro anos, 80% do quadro do Ministério do Trabalho, responsável pelo controle do programa, foi alterado. Um exemplo de como o troca-troca de servidores favorece as fraudes foi revelado em março deste ano no município de Porto Velho (RO). Funcionários do Sistema Nacional de Emprego (Sine) foram flagrados, em investigação da Polícia Federal, em esquema de desvio que lesou a União em pelo menos R$ 14 milhões. Os servidores usavam o acesso ao sistema para emitir guias fraudulentas em troca de propina.
FRAUDES
Investigações da PF identificaram empresas de fachada que simulavam
contratações de funcionários e faziam demissões em massa com
o objetivo de arrecadar recursos do seguro-desemprego
A falta de controle do governo sobre a real situação do setor provocou um aumento assustador no cadastro de desempregados. Em 2003, com taxa de desemprego de 12,4%, 4,9 milhões de pessoas receberam o seguro. Agora, com índice de desocupação na casa dos 5%, 8,9 milhões têm o benefício. Essa expansão teve um impacto impressionante no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), criado em 1990 para assegurar o pagamento do seguro-desemprego e de outros benefícios, como o Programa de Interação Social (PIS). Desde 2009, o fundo está no vermelho em valores crescentes que, em 2015, devem atingir R$ 20 bilhões. As previsões de receitas previstas para o ano que vem são de R$ 62,4 bilhões e, as despesas, de R$ 82,4 bilhões.
Diante da gravidade dos números, o governo busca saídas para estancar o rombo. Para ajudar na fiscalização, o Ministério do Trabalho inicia no próximo mês o teste do sistema biométrico de identificação dos beneficiários. Em outra frente de ação, o ministro da Fazenda, Guido Mantega abriu negociações no início do ano com representantes de centrais sindicais para debater alterações nas regras de concessão do seguro. Os representantes dos trabalhadores foram frontalmente contrários a qualquer tipo de limitação. Em vez de aceitar o diálogo, os sindicalistas informaram que, no próximo ano, lutarão pela inclusão de novas categorias, como as empregadas domésticas. Só em 2014 foram apresentados no Congresso seis projetos de lei propondo mudanças no seguro e todos ampliam as despesas do governo.
Apesar das pressões, Mantega promete cortar os excessos. Na sexta-feira 7, o ministro da Fazenda disse que adotará medidas saneadoras, mas muitos especialistas estão céticos quanto a isso. É o caso do economista Giácomo Balbinotto Neto, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Ele não acredita em mudanças no modelo de distribuição do benefício, pois nem o governo nem o Congresso estão dispostos a enfrentar o ônus de uma medida tão impopular. “É difícil fazer mudanças do ponto de vista econômico. O caminho é fortalecer a fiscalização, dificultando as fraudes”. Na opinião do economista José Márcio Camargo, professor da PUC-Rio e um dos maiores especialistas brasileiros no assunto, a solução para superar a contradição entre a redução da taxa de desemprego concomitante com a maior liberação de seguros passa pela qualificação profissional. A capacitação vincula o trabalhador a seu posto, afirma. No Brasil, a média de permanência no emprego é de 3 anos. A taxa de rotatividade, no entanto, é alta. De total de contratados no país, 37% deixam a vaga antes de completar um ano de casa. O vai-e-vem colabora fortemente com o impacto negativo para o FAT. Além disso, antevendo que o trabalhador não passará muito tempo na empresa, o empregador não investe em qualificação. Para Camargo, ações como o Pronatec são apenas um “esparadrapo”, pois os cursos não conseguem atender a real demanda do mercado.
Durante a campanha presidencial, o PT usou o programa de governo do PSDB - que previa a necessidade de alteração nas regras do benefício - para afirmar que os tucanos atentavam contra conquistas trabalhistas. Passado o clima eleitoral, o Palácio do Planalto e a equipe econômica assumem que têm um problema que não pode ser mais adiado. É o primeiro passo para reverter o desperdício de dinheiro público.
Fotos: Fernando Donasci/Folhapress; SERGIO NEVES/AGÊNCIA ESTADO/AE, Pedro Teixeira/Futura Press
Por que o gasto do governo com o seguro-desemprego bate recorde atrás de recorde apesar de o país estar com uma das menores taxas históricas de desemprego? Parte da resposta pode ser o Bolsa Família, que afastaria muitos da busca formal por empregos, lembrando que a taxa de desemprego é medida com base apenas em quem está a procura de trabalho. Outra parte tem ligação com a elevada rotatividade dos funcionários nos empregos, tendência que se acelerou de uns tempos para cá.
O jornal O GLOBO traz hoje uma reportagem sobre o assunto, mostrando que a probabilidade de duas pessoas terminarem um ano no mesmo emprego é de apenas 13%. Na década de 1990, 45% dos trabalhadores com carteira assinada trocavam de emprego em um ano. A taxa acelerou para 53,9%, em 2002, e atualmente chega a 64%, uma das maiores, quando se consideram todos os motivos para a saída do emprego, como demissão sem justa causa, a pedido do funcionário, aposentadoria, morte ou transferência.
Existem alguns fatores que podem explicar isso. Um deles tem ligação com mudanças culturais. As novas gerações são menos apegadas a tudo, inclusive empregos, e se mostram mais impacientes e ansiosas. O dinamismo é bem maior. Além disso, há a questão do pleno-emprego (ou quase isso), que facilita a decisão de abandonar um trabalho em que não se está muito satisfeito, pois há mais oferta de empregos no mercado.
Um terceiro fator, porém, merece destaque, pois tem elo com nossas leis trabalhistas arcaicas. Após seis meses de trabalho, há um salto nas demissões, e isso se deve ao fato de que já há o direito ao seguro-desemprego após esse período. O trabalhador, então, espera acabar o benefício para voltar a procurar emprego formal, o que torna a rotatividade muito alta em nosso país, mais que o dobro de países como Estados Unidos e Inglaterra.
Segundo José Márcio Camargo, da PUC-RJ e meu ex-professor, trabalha-se sete meses e recebe-se por 12 meses. Em entrevista ao mesmo jornal, ele diz:
Quando um trabalhador é demitido, ele ganha um prêmio, uma recompensa financeira, que é composta pelo saldo do FGTS, a multa de 40% do fundo, o seguro-desemprego e o aviso prévio. Uma pessoa que ganhe um salário mínimo e que trabalhe sete meses, ganha por 12 meses. Quanto menor a taxa de desemprego, maior o incentivo para ser demitido. Há muitos que são demitidos e ficam por um tempo na informalidade, recebendo sem carteira até acabar o seguro-desemprego. Ou seja, recebem dois salários.
[...]
Esse é o problema mais sério da legislação trabalhista brasileira. É uma das principais razões para termos uma produtividade tão baixa. Sem diminuir a rotatividade, não se aumenta a produtividade. A história de outros países mostra que a reforma trabalhista é uma das coisas mais difíceis de serem feitas. Há muitos interesses. Historicamente, as reformas são feitas quando o mercado de trabalho não está bem.
As leis trabalhistas brasileiras datam da era Vargas, inspiradas no fascismo de Mussolini. Tratam o empregador como um explorador e o trabalhador como uma vítima. Desconfiam das livres negociações. Depositam poder demais nos sindicatos e no estado, sem respeitar inclusive o desejo dos próprios trabalhadores muitas vezes. No Brasil, ainda se acredita que basta decretar por lei, colocar no papel, para se tornar realidade. As “conquistas trabalhistas” não levam em conta a realidade ou as leis de oferta e demanda.
Deturpou-se completamente o espírito da coisa. Em um mecanismo de livre mercado, a associação sindical deveria ser totalmente voluntária, e os empregados deveriam ter liberdade para negociar diretamente com os patrões. A maior garantia de bons empregos e altos salários está na concorrência entre empregadores e na produtividade do trabalhador, não no poder sindical ou em decretos estatais. Quem ficasse para trás no processo dinâmico de livre concorrência e “destruição criadora” teria um auxílio temporário, para investir em treinamento, adaptar-se e buscar novo emprego. Assim seria no mundo ideal dos liberais.
Compare-se a isso a realidade atual do Brasil, em que sindicatos concentram poder absurdo, a Justiça do Trabalho trata empresários como exploradores e inúmeras “conquistas trabalhistas” representam apenas privilégios para alguns à custa de outros, que permanecem desempregados ou na informalidade (ainda muito alta por aqui). É preciso flexibilizar as leis trabalhistas com urgência!
Resta saber quem terá a coragem de levantar essa bandeira, sabendo que a esquerda irá acusá-lo automaticamente de ser contra os trabalhadores, o que é uma completa falácia disseminada por sindicatos para preservarem seu imenso poder. Quem sai prejudicado é o próprio trabalhador, assim como todos os pagadores de impostos, obrigados a bancar a farra do seguro-desemprego.
Rodrigo Constantino
Esses camaradas são os maiores propagadores do comunismo no mundo (aqui)